quarta-feira, junho 30, 2004

EXAME POLÍTICO

Por Paulo Teixeira Pinto



Não há política sem acção. Mas agir sem pensamento não é política. Como não é político o pensamento inconsequente.

A política exige, por conseguinte, acção. Mas antes desta deve vir a intenção.

Ora, se o homem político deve sempre pensar para agir, e não deve nunca agir sem pensar, é importante que o faça nas duas dimensões de si. Quer dizer, que procure saber em primeiro lugar e com exactidão o que defende para os outros, para o apresentar como ideal comum. Em nome do qual exercerá pessoalmente, ou pretenderá exercer, um poder democrático, ou seja, em nome de todos. Esta é a correspondência da sua única face visível, daquilo a que se poderia apelidar como o lado extra da política.

Porém, também subsiste uma face oculta, aquela que só o próprio agente político poderá conhecer. Desde que a procure. Com esforço dorido e sinceridade crua. Esta dimensão íntima, escondida, é o lado intrapolítico.

A forma de o descobrir passa por cada sujeito político se sujeitar a um escrutínio interior. A um auto-exame. Que poderá passar por responder a si mesmo às questões que de seguida se enunciam:


Eu e os Outros – a acção política


· Quem vão ser os beneficiários desta acção ou omissão? E quem é que vai ser prejudicado?

· O que é que sucede se não for adoptada esta decisão?

· Qual é a finalidade essencial que se pretende visar com esta concreta iniciativa?

· Foram devidamente ponderadas todas as eventuais alternativas possíveis à minha escolha?

· Que custos indirectos pode provocar esta opção?

· Como se enquadra esta medida no programa a que se deve submeter? Representa a quebra ou desvio de algum compromisso eleitoral?



Eu e Eu – a intenção política



· Acredito em tudo o que faço?

· Lembro-me todos os dias de que os assuntos mais importantes devem ter prioridade sobre os mais urgentes?

· As minhas opções podem causar alguma dificuldade comprometedora para outro membro da equipa a que pertenço?

· Tenho a certeza, ou pelo menos um razoável grau de convencimento, de que posso cumprir tudo o que anuncio ou prometo?

· Faço sempre o que é preciso, mesmo quando com o custo da minha popularidade pessoal?

· Tenho sempre presente, antes de decidir, que o poder não é meu, e que tenho estrita obrigação de o usar o melhor possível, em nome e no interesse daqueles que mo delegaram?

· O critério principal que motiva todas as minhas acções ou omissões é o da convicção que publicamente proclamo ou o da minha conveniência pessoal que escondo?

· Sinto-me realmente capacitado para exercer com dignidade e lealdade as responsabilidades que me foram confiadas?

· Persigo a excelência? Procuro constantemente um grau superlativo de cumprimento ou contento-me com a mediocridade que se pareça com suficiência?

· Penso com regularidade no que fariam no meu lugar aqueles que intimamente sei serem melhores do que eu?

· Quando nomeio alguém escolho por regra aqueles que penso serem os mais aptos e qualificados, com carácter e independência intelectual? Ou prefiro aqueles a quem devo ajudas e favores, ou que me são elogiosos e incondicionais?

· Sou submisso e dócil com tudo quanto me dizem aqueles que têm mais poder do que eu, ainda que não concorde com as suas posições ou comportamentos, apenas para gerir a minha carreira?

· Trato com desdém e aparente superioridade aqueles que dependem directamente de mim?

· Insinuei ou repeti algo que sei não ser verdadeiro com o intuito de atacar um adversário político ou pessoal?

· Fui cobarde e pedi para ser citado sob anonimato?

· Prefiro proteger a minha imagem mediática com prejuízo da solidariedade que devo a outros?

· Acuso ou denuncio falsamente aqueles que concorrem directamente comigo para discussão de algum cargo?

· Percebo que quando duas pessoas concordam absolutamente em tudo é porque uma delas ou não pensa ou está a fingir?

· Respeito sempre a diversidade de juízos, mesmo quando injustamente críticos das minhas decisões? Obrigo-me a respeitar que tudo quanto não constitui uma certeza objectiva é falível e, portanto, livremente opinável?

· Sei porque é que poder e a glória são verdadeiramente diferentes e não apenas nomes distintos da mesma realidade?

· Acredito sinceramente que o poder não é um fim em si? E que nenhum fim político justifica quaisquer meios que atentem contra os princípios?

· Mereci conquistar o poder?

· Estou sempre preparado para considerar cada momento como o último em que posso deter o poder? E estou pronto para o abandonar sem tristeza ou rancor?


1 comentário:

O Corcunda disse...

Parece-me mais um manifesto moral do que uma reflexao sobre o essencial da politica.
Parece-me que, em varios pontos cai na falacia moderna de uma excessiva preocupaçao com as perspectivas do outro, do que uma real preocupaçao com o seu bem, e por esse facto confundir o que e Prudencia e a percepçao do Bem, de cariz noetico... A perspectiva aristotelica centrada em Ideal e Circunstancial parece-me ser a mais esclarecedora. Sem o outro nao posso compreender, mas sem ignorar o outro nao poderei chegar a essencia das coisas... Nao poderei compreender o que e bom para Nos se estiver submetido a sua Vontade!

Tambem nao podemos esquecer que a "Nobre Mentira" pode ser uma importante arma da Verdade...