quarta-feira, novembro 30, 2005

COISAS QUE PARECEM EVIDENTES

CARTA DO CANADÁ
por Fernanda Leitão


Acompanhar o mundo através dos meios da comunicação social, nos dias que correm, é um exercício de sofrimento a que não nos podemos furtar sem sentirmos culpa. Em todos os continentes, pelo que vimos e lemos, povos inteiros sofrem guerra, fome, doença sem assistência, privação de liberdade, risco de vida quando tentam a emigração clandestina, revoltas em guetos suburbanos, todo este calvário humano emoldurado na pastosa da retórica que é de uso entre políticos e outros mentirosos.
É este um garantido e estranho sofrimento, principalmente para os que, independentemente da religião que pratiquem, ou que não pratiquem nenhuma, pautam o sentido da sua vida pelo respeito que é devido à pessoa humana e à Natureza.
De facto, a pessoa humana tem direito aos bens básicos: saúde, habitação, educação, trabalho e liberdade de expressão e associação, e atmosfera limpa. Nos poucos países onde estes direitos estão garantidos, os povos não agradecem aos políticos nem lhes fazem vénia pela simples razão de lhes terem dado o pedido voto para que realizassem essa tarefa nobre de garantirem e respeitarem o direito natural dos povos. Nos poucos países que gozam desta normalidade, os povos não baixam a cabeça diante dos políticos, olham nos olhos dos eleitos, com simpatia se eles se portarem bem, com desprezo se eles tentaram caminhos ínvios. Nesses países, os políticos são empregados do povo, e apenas isso: dá-se-lhes uma tarefa e espera-se que cumpram. Para isso o povo lhes paga. E por isso, através de eleições, os povos despedem quem não serve.
Infelizmente, são em maior número os países em que os políticos se consideram uma casta, uns seres predestinados que podem usar e abusar do dinheiro e da paciência do povo, sem darem contas nem mostrarem contrição quando apanhados em falta. Há mesmo países tão atrasados que neles vicejam, enriquecem e se perpetuam aqueles que mais mentiram e roubaram. É, entre outros casos de democracia mal entendida,
a situação em países de África, América do Sul e Ásia, e mesmo entre as ex-colónias da União Soviética e o Médio Oriente, onde os povos emigram aos milhões... muitas vezes para países onde políticos e outros mentirosos têm vindo a apoiar, por anos a fio, os seus comparsas a quem sobra em impiedade e estupidez aquilo que lhes falta em respeito por si mesmos e pelos povos que dominam em vez de servirem.
Esta cumplicidade tenebrosa é a causa das vagas de emigrantes desesperados que morrem em barcos de acaso nos mares ou que se esfarrapam em muros de arame farpado, todos acossados pela fome, pela guerra, pela doença, pela ausência de liberdade e de respeito nos seus países. Ninguém emigra por gosto ou por desporto.
A emigração é uma provação enorme que parte o coração de qualquer um. Quem disser o contrário, não sabe o que está a dizer. Só há uma solução, talvez utópica, para dar ao mundo a paz de que ele precisa urgentemente: em vez de esmolas que quantas vezes se perdem em bolsos corruptos, os povos precisam de ter terra sua para lavrar, minas para explorar, mares para pescar, escolas para formar gerações, hospitais dignos desse nome. Esse é o grande desafio que se põe aos países em que se respeitam os direitos básicos do seu próprio povo, à custa da rapina, mais ou menos solapada, que exercem em países que desrespeitam esses direitos básicos através da cumplicidade que tecem com os políticos locais – esses seres espantosos que vestem Pierre Cardin e têm filhos a estudar nas capitais europeias, enquanto o seu povo anda andrajoso, esfomeado e sem direito a nada. Será uma utopia desejar isto, mas se a humanidade perder a capacidade de sonhar, a vida não tem sentido.
Nós, portugueses, sempre que sonhámos grande, fizemos algumas coisas de mérito que a História registou. Nós, portugueses, sempre que fomos assumidamente humildes, ganhámos o mundo e o respeito dos outros povos. Perante a mediocridade e mentira que somos obrigados a suportar, só temos um saída: sonhar grande, com humildade e fé, agir de boa fé e sem medo. Agora mesmo.

sábado, novembro 26, 2005

Sobre a Decadência do Debate de Ideias

Com a devida vénia, reproduzimos da página da Associação dos Professores de História ( http://www.aph.pt/opiniao/index.html):

Sobre a Decadência do Debate de Ideias
Por Paulo Guinote

«A apresenta uma opinião, enquanto B pensa na que irá injectar logo que possa, de forma decente. Isto é uma troca no sentido em que “trocamos” saudações: oferecemos uma fórmula e é-nos oferecida outra, mas geralmente vamo-nos embora com a nossa

J. Barzun, The House of Intelect, p. 63.


Há mais de quatro décadas, Jacques Barzun ocuparia boa parte de um dos capítulos da sua obra The House of Intelect (1959, 22002) lamentando o declínio da conversa como forma privilegiada para o debate de ideias e para o exercício produtivo das nossas capacidades intelectuais. Segundo ele o hábito de conversar intelectualmente desapareceu quase por completo na sociedade ocidental. Em vez de construirmos uma conversa, articulando o nosso raciocínio no dos nossos interlocutores, analisando argumentos, avançando para novas ideias, limitamo-nos a "trocar ideias", no sentido comercial do termo. Toma lá a minha opinião, dá cá a tua, e pronto, já está, ficamos à mesma na nossa e tudo fica na mesma.

A razão para esta situação, segundo Barzun, está naquilo a que chama a ascensão das “maneiras” dos “bons modos” que, a coberto de pretensos ideais democráticos, parece querer a todo o custo evitar os problemas e os confrontos, em busca de um consenso que a ninguém desagrade e a todos satisfaça.

Realmente, embora escrito em 1959, isto retrata a actualidade da nossa vida intelectual e académica de forma atrozmente rigorosa. Ninguém está para pensar sobre o que os outros dizem. Apenas se aceita ou recusa, ponto final, sem mais elaboração. E quando as ideias diferem, o mais habitual é uma de duas soluções, ou ignorar as opiniões adversas ou então atacá-las como ofensivas sem discutir os seus argumentos. Agora discutir ideias, analisá-las, aperfeiçoá-las, modificá-las perante os outros, isso é que não porque parece ser sinal de fraqueza das nossas próprias convicções ou crenças.

Esta atitude traduz-se, na prática, numa crescente esterilidade do que passam por ser os “debates” de ideias no nosso país da vida política à académica mas passando por quase todos os aspectos da nossa vida. Os danos que este autismo traz manifestam-se, em minha opinião, em duas situações de igual modo prejudiciais ao desenvolvimento intelectual da nossa sociedade:


Por um lado, a cristalização das divisões entre as várias áreas científicas ou disciplinares em que o conhecimento humano se foi fragmentando, particularmente após a crítica pós-moderna ao paradigma herdado do positivismo. Da macro-divisão primordial entre as chamadas ciências físico-naturais, ditas “exactas”, e as ciências sociais e humanas, às subdivisões no interior de cada disciplina/ciência, o conhecimento humano foi ficando cada vez mais compartimentado e foram ficando cada vez mais reduzidas as possibilidades de debate de ideias em virtude dos antagonismos desenvolvidos pela competição entre as cada vez mais especializadas micro-áreas do conhecimento. Apenas a título de exemplo, recuperemos o movimento de progressivo estilhaçamento das Ciências Sociais e Humanas que, da autonomização dos campos próprios da Sociologia, da Antropologia ou mesmo da Psicologia em relação à Filosofia, à História ou mesmo à Geografia, passou para um mosaico quase infindável de micro-variantes que, mesmo quando ditas transversais e transdisciplinares, só sentem que a sua identidade está construída quando delimitam ferozmente as suas fronteiras e uma linguagem própria em relação aos campos do saber mais próximos. Aqueles que pretendem, sob o manto da construção de um “novo paradigma” ou de um “paradigma emergente”, alcançar uma nova unificação do saber recuperando o “senso comum” como via válida para o conhecimento científico, parecem esquecer que um paradigma não é meramente uma nova teoria concorrente às preexistentes, mas sim o conjunto de teorias que, de uma forma mais ou menos articulada, constituem o corpo de “conhecimento” aceite enquanto tal pela maioria da comunidade científica num dado período. E, neste sentido, estamos actualmente, muito longe de um paradigma aceite pacificamente pela maioria de uma comunidade científica fragmentada e pouco dialogante.

Por outro lado, a inutilidade de muitos encontros ditos “científicos” entre especialistas de determinadas temáticas em que cada um se apresenta munido das suas opiniões, as quais são expostas com maior ou menor rigor e/ou brilhantismo mas que, em boa verdade, acabam por nunca ser verdadeiramente contraditadas mas meramente trocadas. Se não são apenas sumariamente elogiadas, por obrigação formal da ocasião, são criticadas pelos seus oponentes mas de uma forma que inviabiliza o seu eventual aperfeiçoamento através de um debate sério. Neste caso, as divisões de carácter disciplinar dão lugar à competição entre especialidades e, muito mais grave, às inimizades pessoais que se traduzem num isolamento de grupos de indivíduos com interesses comuns, que lutam por um melhor posicionamento na comunidade intelectual/académica, degladiando-se entre si sem nunca confrontar verdadeiramente as respectivas posições.

No caso da História, que aqui mais nos interessa e ocupa, este movimento para a hiper-especialização começou por cruzar a segmentação cronológica de maior ou menor amplitude com as divisões temáticas de maior (História Social, História Económica, História Política, História Cultural, História Institucional, etc, etc) ou aparente menor ambição (História dos Descobrimentos, História das Mulheres, História das Técnicas, História deste ou daquele conflito militar, entre muitos exemplos possíveis).

Um pouco à semelhança das clivagens políticas, à medida que a fragmentação cresce, maiores são os muros que se levantam contra o exterior, e quanto mais específica a área de estudo (por exemplo, a penetração dos Jesuítas no Tibete entre 1570 e 1580) maior é a animosidade contra a concorrência próxima (a influência franciscana no Tibete entre 1575 e 1585, continuando no nosso exemplo caricatural). E também à imagem da vida política, acaba tudo por culminar no plano pessoal do relacionamento entre investigadores de uma mesma micro-área de trabalho ou de micro-áreas contíguas.

Nunca encontrei reacções tão negativas e violentas ou atitudes de mais ostensiva ignorância mútua como entre estudiosos de um mesmo tema que, sentindo-se ameaçados, baseiam o seu comportamento em estratégias de uma agressividade mais activa (ataque pessoal sem debate de ideias) ou passiva (manifestação de desconhecimento do trabalho de outrém como forma de evitar a sua discussão).

Esta atomização, por paradoxal que pareça, é reforçada pelos comportamentos de grupo em que os investigadores se envolvem como mecanismo de defesa perante o que acham ser ameaças externas. Funcionando em grupo num sistema que lembra as velhas clientelas romanas, os indivíduos sentem-se mais protegidos e, em simultâneo, mais poderosos, conforme a notoriedade do(s) seu(s) patrono(s). Neste sistema, como parece natural, a protecção é muitas vezes feita à custa de um pouco da nossa liberdade (neste caso, a intelectual) e as heterodoxias são duramente punidas.

A tradução prática deste tipo de comportamentos, para além da trivial e secular pura maledicência mais ou menos dissimulada, encontra-se na forma como funcionam as poucas revistas da especialidade que sobrevivem entre nós (com dificuldades nascidas do público diminuto de fiéis a que se dirigem), nos mecanismos de selecção de colaboradores ou mesmo da redacção de recensões ou de divulgação de projectos de investigação em curso. Como é óbvio, seleccionam-se e divulgam-se apenas os “nossos”, a menos que seja para sumariamente criticar de forma destrutiva os “outros”, para isso servindo o mais ligeiro pretexto ou lapso encontrado. No caso particular das recensões, é curioso como as feitas sobre as obras dos “nossos” são meros resumos encomiásticos do seu conteúdo, quase podendo ter sido feitas pelos próprios autores para colocar na contra-capa do livro a pedido da editora, enquanto as que são feitas sobre os “outros” passam quantas vezes apenas por detectar o pequeno pormenor errado ou a velada acusação de ignorância e incompetência. Apenas para exemplificar, há um ano ou dois, numa revista da especialidade, três bons investigadores com responsabilidades na História da Expansão Portuguesa envolveram-se em dura polémica sobre a qualidade da respectiva competência científica, usando como argumentos fundamentais para a “discussão” questões de favores pessoais concedidos/recebidos, mas raramente confrontando ideias, conceitos ou métodos de trabalho.

Esta agressividade é o reverso da atitude que postula o silêncio sobre a “concorrência” como forma de a tornar invisível. Neste caso, os exemplos seriam ainda mais fáceis de encontrar, desde os casos em que um(a) especialista de determinada área de estudo é convidado a apresentar um ponto da situação da pesquisa realizada à mera leitura das bibliografias de obras tidas como “de referência”.
Em qualquer dos casos, aquilo a que se procura fugir é a um verdadeiro confronto de ideias, ao debate em torno de concepções diferentes sobre um mesmo fenómeno ou assunto e a uma eventual reavaliação das nossas próprias convicções perante o seu confronto com outras alternativas, em resumo, é a fuga exactamente ao que devia constituir o cerne do trabalho intelectual. O contraditório não é necessariamente uma ameaça, mas antes um mecanismo indispensável para o progresso.

Infelizmente, tanto a agressividade crítica não fundamentada como o ignorar ostensivo das vozes discordantes, só agravam o isolamento paroquial a que se têm vindo a votar muitas das áreas de especialização não só da História como do próprio conjunto das Ciências Sociais e Humanas, ainda seduzidas pelo brilho retórico do paradigma pós-moderno e incapazes de ultrapassar o seu relativismo, mesmo quando recorrem às mais elaboradas construções teóricas para esconder o vazio do seu conteúdo. Aliás, talvez a decadêncida do debate de ideias seja consequência directa e inevitável desse mesmo vazio.

Paulo Guinote

segunda-feira, novembro 21, 2005

Querem República? Paguem-na!

por Dom Vasco Teles da Gama

O colapso da Europa está em curso, curiosamente, na pátria da república e em parte por causa dela. Pasme-se! Os tumultos nos arredores de Paris não foram pronta e firmemente reprimidos pelo Estado de Direito, porque o Presidente em final de mandato está sem poder real e o Ministro do Interior do Governo é um dos pré-candidatos à sucessão, contra o actual Primeiro-Ministro. Assim, quanto pior for o desempenho deste, mais hipóteses terá o outro. Quanto a ética, estamos conversados.
Em Espanha, nasceu uma princesa. Para quem, como eu, ainda não esqueceu os Filipes que por cá reinaram, Leonor é uma boa notícia, não vá a História repetir-se.

Cá pelo burgo, apesar do pânico da gripe das aves, entrámos em pré-campanha para eleger mais um presidente. A previsível opção será entre o "profissional" que sabe de humanidades e tem a inegável vantagem da experiência, mas já tinha direito a reforma, mesmo ao abrigo da nova legislação socrática, ou o não profissional assumido, que sabe de finanças, seja lá para o que tais atributos nos venham a servir.

Mas ao pensar que, com o mesmo orçamento, os Espanhóis têm uma Família Real e com menos, têm os Belgas outra, pergunto-me se, constantemente forçados a apertar o cinto pela escassez de meios, não teremos escolhido (?) o sistema errado. Se ao orçamento juntarmos as despesas eleitorais e os custos políticos da divisão que ocorre em cada cinco anos, entre os portugueses, o valor agrava-se. "Last but not least", a tudo isto somam-se as reformas pagas a ex-chefes de Estado, mais as respectivas instalações (para o Dr. Sampaio já está em obras o atelier de pintura da Rainha D. Amélia, no Jardim das Necessidades), Secretárias, carro com motorista e seguranças.

Alguém nos explica que contrapartidas dão estes ilustres reformados à Nação, pelas regalias de que auferem? Não seria mais barato pagar-se-lhes um subsídio de reintegração, a reforma que já recebem e devolvê-los em paz para donde vieram? Como é que podemos pagar tão variados e elevados custos, com uma instituição que nos divide e cujo exercício nos tem demonstrado, como temos abundantemente verificado, que serve alternadamente de força de bloqueio ou de válvula de protecção à actuação dos governos, conforme eles sejam ou não do partido que os elegeu?

A estas perguntas, respondem os políticos com uma blindagem da Constituição, que nos obriga à forma republicana de governo, quer queiramos, quer não.

Querem república? Então paguem-na!

(In Diário Digital, em 21 de Novembro de 2005)

sexta-feira, novembro 18, 2005

Três jovens pesquisadores premiados por Bento XVI

Por sua contribuição na promoção do humanismo cristão

CIDADE DO VATICANO, quinta-feira, 17 de novembro de 2005 (ZENIT.org).- Bento XVI premiou a pesquisa de três jovens intelectuais por sua contribuição na promoção do humanismo cristão.

O vencedor desta edição do Prémio das Academias Pontifícias, instituído há dez anos por João Paulo II, foi o doutor Giovanni Catapano, de Pordenone, por sua obra «O conceito de filosofia nos primeiros escritos de Santo Agostinho. Análise dos passos metafilosóficos desde o “Contra Academicos” ao “De vera religione”».

Bento XVI, que também fez a sua tese sobre Santo Agostinho, reconhece em uma mensagem enviada à Sessão Pública anual das Academias Pontifícias, celebrada na terça-feira passada, 15 de Novembro, que a pesquisa de Catapano «indaga adequadamente na concepção filosófica do “primeiro” Agostinho em seus aspectos mais originais».

O prémio, entregue no Vaticano, foi proposto ao Papa pelo Conselho de Coordenação das Academias Pontifícias, cujo presidente é o cardeal Paul Poupard, presidente do Conselho Pontifício para a Cultura.

Giovanni Catapano doutorou-se em 1999 em filosofia na Universidade de Pádua e dedica-se à filosofia moral e à história da filosofia e patrística.

Por sugestão do próprio Conselho de Coordenação, o Papa --«como sinal de apreço e alento»-- entregou também duas medalhas pontifícias a outros dois jovens pesquisadores.

Trata-se, em primeiro lugar, do doutor Massimiliano Marianelli, da Universidade de Perúgia, por sua obra «A metáfora reencontrada. Mitos e símbolos na filosofia de Simone Weil», publicada na Itália por «Città Nuova».

O outro premiado com a medalha do Papa é um sacerdote e professor da Universidade Pontifícia da Santa Cruz, Santiago Sanz Sánchez, originário de Talavera da Rainha (Toledo, Espanha), por seu estudo sobre «A relação criação e aliança na teologia contemporânea».

terça-feira, novembro 15, 2005

DE PAPOILA AO PEITO

CARTA DO CANADÁ

por Fernanda Leitão

Estando o céu bem disposto com o Canadá, os primeiros dias de Novembro em Toronto vêm soalheiros e macios, honrando assim a tradição do Verão dos Indios, que vem a ser como o portuguesíssimo Verão de S. Martinho. Um sol especialmente brilhante, que acaricia e não queima, perde-se por entre as derradeiras árvores quase despidas do dourado esplendor do Outono, e torna quase irreais os longos tapetes de folhas caídas ao longo dos jardins e parques que voam ao de leve sob a brisa que, delicadamente, avisa que o Inverno vem a caminho.
Nesses dias poucas são as lapelas e botoeiras que não ostentam uma rubra papoila que centenas de voluntários do Salvation Army e de outras instituições cívicas põem ao peito dos que depositam nas suas caixas a contribuição para as associações dos antigos combatentes. Nas horas de ponta, quando as multidões fazem rios caudalosos, as papoilas correm, reflectem-se nas vidraças, dobram esquinas, sobem escadas rolantes, enchem os transportes, tomam conta da cidade, como se esta fora uma seara abundante. Na Primeira Guerra Mundial, um poeta soldado anglo-saxónico, em combate na Flandres, ficou emocionado ao encontrar papoilas nos vastos campos sulcados de trincheiras, entre pedras, em tufos de perdido trigo. Escreveu um poema que para sempre ficou como memória dos milhares de homens que o Canadá e os Estados Unidos perderam em campos de batalha da Europa em guerra.
As papoilas saltaram dos versos para as lapelas e botoeiras dos que fizeram do Norte da América o lar que os seus países não lhes puderam ou souberam dar.
Resulta natural que, de papoila ao peito, desde a Governadora Geral até ao mais humilde cidadão, todos participem, no dia 11 de Novembro às 11 horas, das cerimónias provinciais em memória dos que tombaram nas guerras, desde a primeira até às actuais. E que todos sigam pela televisão as cerimónias em Otava, na colina onde está o parlamento federal. Cerimónias que, contando com a oração pública dos chefes das grandes religiões e com a deposição de coroas de flores nos monumentos dedicados aos combatentes, exibem um cortejo de guardas da Raínha, dos regimentos escoceses e dos batalhões actuais, com as suas bandeiras e fanfarras. A nota emocionante é a do cortejo que se lhe segue, os antigos combatentes, eles mesmos, fardados e com as medalhas, muitos deles em cadeiras de rodas, mas todos de cabeça erguida e a postura humilde de quem serviu bem. Ao longo das ruas, dezenas de milhares de pessoas, aplaudindo. Mares de crianças com bandeiras do Canadá, muitas delas agitando bandeirolas onde se pode ler THANK YOU. Crianças a quem foi ensinado que devemos a nossa liberdade e bem estar àqueles homens e mulheres que arriscaram a vida na luta contra a besta sanguinária e tirana, dizem OBRIGADO. O Canadá não é um país militarista, antes é um país de paz que conta com forças armadas de grande profissionalismo e dedicação, com abundantes provas dadas em missões um pouco por todo o mundo.
Nem eu, que escrevo estas linhas, sou militarista. Mas, porque a História é quem manda, sei bem que Portugal foi fundado por um Príncipe e seus próximos, pelos servidores da Igreja e pelos militares. Não é um país de acaso. É um país com destino marcado. Os militares portugueses foram estimados pelo povo sempre que este se revia neles, e daí vinha a sua força. A sua fraqueza adveio da fatalidade de, no curto espaço de pouco mais de meio século, terem sido pretorianos de um regime ditatorial, de que se tentaram redimir fazendo o golpe militar de 25 de Abril de 1974. Passada a euforia, um bando de militares vendidos a partidos e interesses internacionais, caíram na fraqueza de serem a guarda pretoriana do novo totalitarismo, desta vez, comunista. Toda a Nação sofreu com isso, e ainda sofre. Penso, no entanto, que estes 31 anos de novo regime deram razão aos militares que se rebelaram ou afastaram, servindo de crua lição a todos os militares jovens. É esta ala jovem a força das actuais forças armadas. Do mesmo modo que a juventude remoça e fortalece a Igreja.
Creio ser tempo de se ensinar às crianças o que quer dizer um OBRIGADO que contempla a força subterrânea de um povo sofrido, mal amado, mas em quem a esperança não desfaleceu ainda.

domingo, novembro 06, 2005

JOSEPH PEARCE EM PORTUGAL (9-13 Novembro 2005)

Biógrafo de Tolkien, Chesterton, CS Lewis, Oscar Wilde, etc.

9 Novembro, 4ª fª, 18h00 – “Modernism and Catholicism”Conferência a alunos de Mestrado e Doutoramento da Universidade Católica Portuguesa (UCP)

Sala de Exposições

Entrada Livre



10 Novembro, 5ª fª, 18h00 – “Catholic thought and Culture”

Conferência integrada no ICNE

UCP, Anfiteatro A1

Entrada Livre



11 Novembro, 6ª fª, 19h30 – “G K Chesterton: Wisdom and Innocence

Conferência promovida pelo Centro Cultural de Lisboa Pedro Hispano, integrada no ICNE

UCP, Anfiteatro A1

Entrada Livre


12 Novembro, sábado, 10h30 – “CS Lewis and The Chronicles of Narnia”

Tertúlia na sala 1 do Cinema Londres, no âmbito da rubrica do Magnolia Caffé “Cultura ao Pequeno Almoço”, com a colaboração do Centro Cultural de Lisboa Pedro Hispano.

Poderá ser adquirida a edição portuguesa, da Editorial Presença, de “As Crónicas de Nárnia”, cuja adaptação ao cinema foi feita pela Disney e estreará em Portugal no dia 8 de Dezembro.