quarta-feira, setembro 28, 2005

MULTICULTURALISMO É POSSÍVEL

CARTA DO CANADÁ

por Fernanda Leitão


Eu começaria por acrescentar que o multiculturalismo é desejável e agradável. Porque assenta sobretudo no respeito pelos outros, na generosidade e na educação.
Monarquia parlamentar, cuja chefia do estado é protagonizada pela Raínha de Inglaterra, com constituição própria, outorgada em 1982 pela Grã Bretanha e assinada pela Raínha Isabel e o então primeiro ministro, Pierre Trudeau, o Canadá é um país feito por imigrantes de 160 países. Sendo um país obrigatoriamente bilingue (inglês e francês), o cimento que une as comunidades étnicas é o domínio de uma das línguas do país, o rigoroso respeito pela raça, religião e cultura. Os cidadãos são todos iguais perante a lei. A democracia, não sendo perfeita, é praticada pela vigilância do povo, através da informação, pela intervenção popular quando é caso disso, mas só quando é preciso, em geral através de eleições que o governador geral ratifica a pedido do governo ou, em última instância de crise, pelo clamor do povo junto de quem assume ou representa a chefia do estado.
O governador geral, que está em Otava, numa mansão que não é das maiores nem das mais ricas, mas com guarda igual à da soberana, representa no conjunto do país o chefe do estado. Apontado pelo governo federal, o governador só o é com o acordo da Raínha. E porque o país, vai do Atlântico ao Pacífico, à largura, e dos Estados Unidos da América ao Polo Norte, à altura, o Canadá é uma confederação de dez províncias e três territórios. Há, em cada província, um vice-governador, um parlamento e um governo provincial. Há pastas que são apenas do foro do governo federal.
No dia 27 de Setembro, terminou o seu mandato a governadora Adrienne Clarckson, nascida em Hong Kong de uma família chinesa e criada no Canadá desde os sete anos. Casada com o escritor canadiano John Saul, mãe de duas filhas e avó de vários netos, Adrianne Clarckson fez um respeitado e popular nome por ser uma das mais talentosas jornalistas da TV estadual. Viu o seu prestígio alargado como governadora pelo aprumo, o patriotismo, a simpatia e modéstia com que prestou relevantes serviços ao Canadá. Foi a mais impressiva embaixadora do país além fronteiras, a privilegiada interlocutora da Raínha Isabel, a infatigável chefe de estado substituta que percorreu este imenso país para dialogar com as mais longínquas comunidades, com sublinhado para os índios e os esquimós. Na hora de saír, rodeada de aplausos e gratidão, deu ainda o seu nome a uma taça desportiva anual (a exemplo do que fez um antigo governador que ficou sendo o padrinho da Taça Stanley) e fundou o Instituto da Cidadania, que tem por objectivo educar, informar e formar civicamente todos os imigrantes que, após três anos de residência legal, requerem a cidadania. É um grande contributo para o amadurecimento cívico dos imigrantes que um dia irão pousar a mão na Biblia ou no lado esquerdo do peito se não pertencem a nenhuma religião, ao jurarem fidelidade à Raínha Isabel e seus descedentes, bem como ao soberano país que é o Canadá e o papel que representa no mundo, muitas vezesatravés de forças armadas exemplares em tarefas de paz. Perguntará o leitor: como é isso de o Canadá ser soberano e ter o chefe do estado a residir na Europa? É simples: o Canadá, ao pedir constituição própria e soberana, decidiu livremente manter a chefia do estado. Porque gosta e porque fica muito mais barato do que ter um presidente de República, oriundo de um partido, a dividir o país sempre que houvesse eleições.
A nova governadora geral do Canadá entrou já em funções. É, mais uma vez, uma jornalista da TV estadual: Michaelle Jean, uma senhora negra do Haiti que veio garotinha para o Canadá, onde se formou pela Universidade de Montréal, onde aprendeu a falar e escrever meia dúzia de línguas, onde casou com um realizador de cinema canadiano e onde lhe nasceu uma filha há dez anos. Antes de entrar em funções, foi a Londres apresentar-se à Raínha acompanha do marido e da filha, tendo passado dois dias em Balmoral com a Família Real Britânica.
Como se pode ver, o multiculturalismo e o multilinguismo são possíveis, em toda a paz, no Canadá, que é tão grande e, por isso, exige uma máquina administratica bem oleada e eficiente. Mas é possível porque o Canadá não recebe imigrantes para os lançar nos bairros da lata. Gasta milhões a dar escola aos que aqui entram, na maior parte dos casos sem saberem uma palavra de inglês ou de francês. Faz deles cidadãos profissionalmente apetrechados e livres de organizarem as suas associações, as suas escolas, as suas igrejas, as suas empresas. Apetrechados e livres de usarem o seu voto de forma adequada.
O Canadá e as suas gentes são pouco conhecidos no mundo. Talvez Tolstoi tivesse razão quando escreveu que “as pessoas felizes nao têm história”... Não é um país perfeito, nada disso, mas é um país onde as pessoas são respeitadas pelo poder público, e se respeitam entre si, e que por isso fazem da democracia vigilante uma tarefa diária.

quarta-feira, setembro 21, 2005

«Máquinas de assalto ao poder»

“E assim o mundo democrático vai caindo numa ou noutra conclusão do dilema que resume a sua evolução fatal: ou na demagogia anárquica ou na férrea ditadura partidária.
As greves, que se sucedem dia a dia, outro mal endémico das democracias, parecem demonstrar que o povo não está contente com «os governos do povo pelo povo e para o povo»…
Estranho caso. A «soberania popular» não é do agrado do seu «soberano»?”

In Os pilares da Democracia de Mário Saraiva (Lisboa, 1949, p. 101).

segunda-feira, setembro 19, 2005

AGENDA - Raul Lino e Luís de Freitas Branco

RAUL LINO

Uma exposição dedicada aos 125 anos do nascimento do arquitecto Raul Lino (1879-1974) pode ser vista no Palácio Nacional de Sintra, até 8 de Novembro de 2005, das 10h às 17h30.

«Raul Lino – Um Olhar sobre Sintra» é uma exposição focada na obra do arquitecto e, ao mesmo tempo, uma mostra do património arquitectónico contemporâneo do concelho de Sintra (recorde-se que Raul Lino é o autor de vários projectos em Sintra, como é o caso das Casas do Cipreste, uma obra de 1912 que viria a adoptar como imagem de marca, e dos Penedos). E é, igualmente, uma exposição que evoca o arquitecto como artista multifacetado, exibindo desenhos e pinturas da sua autoria.

Raul Lino, que viria a adoptar o Cipreste como sigla, projectou mais de 700 obras ao longo da vida. Fez a sua formação em Inglaterra e na Alemanha, local onde frequentou uma Escola de Artes Decorativas e onde trabalhou com o arquitecto Albrecht Haupt.

Entre as obras da sua autoria, contam-se o Pavilhão Português da Exposição Universal de Paris (1900), a Casa dos Patudos, em Alpiarça (1904), o Cinema Tivoli (1925), o Pavilhão do Brasil na Exposição do Mundo Português (1940), o Grande Hotel do Luso (da mesma época) e um conjunto de casas no Estoril (1901-1906), entre as quais a do seu amigo pianista Alexandre Rey Colaço.

Foi, ainda, autor de vários textos sobre questões da arquitectura doméstica popular, como «A Casa Portuguesa» (1929), «Casas Portuguesas» (1933) e «A Evolução da Arquitectura Doméstica em Portugal» (1937), «Quatro Palavras sobre Urbanizações» (1945) ou «Quatro Palavras sobre Arquitectura e Música» (1962).

Horário:
10h-17h30 (última entrada às 16h30)
Encerra às quartas-feiras
O acesso à exposição está incluído no ingresso ao Palácio Nacional de Sintra (4 euros)
Descontos para cartão jovem, jovens até 25 anos e reformados (2 euros)
Gratuito: domingos e feriados até às 14h e grupos escolares por marcação (219 106 840/841)


fontes

http://novo.oasrs.org/conteudo/agenda/noticia1132005.asp

http://www.cm-sintra.pt/AgendaCulturalArtigo.aspx?IDArtigo=541&IDMagazine=37


LUÍS DE FREITAS BRANCO
Vai realizar-se de 23 de Setembro a 10 de Outubro, o VIII Festival Internacional de Órgão de Lisboa, dedicado a Luís de Freitas Branco (1890-1955).

Direcção Artística: JOÃO VAZ · ANTÓNIO DUARTE
Organização: JUVENTUDE MUSICAL PORTUGUESA

Sé Patriarcal de Lisboa, Igreja de São Vicente de Fora, Igreja de São Roque, Igreja de Santo António de Lisboa, Igreja de São Luís dos Franceses, Basílica da Estrela, Basílica do Palácio Nacional de Mafra

Entrada livre em todos os concertos

Sexta-feira, 23 de Setembro – 21:30h Sé Patriarcal de Lisboa
Concerto de Abertura
Música Sacra Parisiense do Novecentos
João Vaz – órgão
António Duarte – órgão
Coro de Câmara de Lisboa
Coro de Câmara do Instituto Gregoriano de Lisboa
Coro Infantil do Instituto Gregoriano de Lisboa
Coro Masculino da Escola de Música do Conservatório Nacional
Teresita Gutierrez Marques – direcção
Armando Possante – direcção
Paulo Brandão – direcção

Sábado, 24 de Setembro – 21:30h Igreja de Santo António de Lisboa
Recital de Trompete e Órgão
Pedro Monteiro – trompete
Antoine Sibertin-Blanc – órgão

Domingo, 25 de Setembro – 17:30h Basílica do Palácio Nacional de Mafra
Concerto a Dois Órgãos
Jean Ferrard – órgão
Thomas Deserranno – órgão

Segunda-feira, 26 de Setembro – 21:30h Sé Patriarcal de Lisboa
Música Belga
Jean Ferrard – órgão

Terça-feira, 27 de Setembro – 21:30h Igreja de São Roque
Recital de Cravo e Órgão
Gustav Leonhardt – cravo e órgão

Sábado, 1 de Outubro – 21:30h Igreja de São Vicente de Fora
Música Ibérica
José Luis Echechipía – órgão

Domingo, 2 de Outubro – 16:30h Sé Patriarcal de Lisboa
Música Antiga Boémia e Checa para Órgão
Pavel Kohout – órgão

Quinta-feira, 6 de Outubro – 21:30h Igreja de São Luís dos Franceses
Música Coral de Luís de Freitas Branco
Grupo Vocal Olisipo
Armando Possante – direcção
António Duarte – órgão

Sexta-feira, 7 de Outubro – 13:30h às 19:30h Igreja de São Roque
Dia ECHO
Festa Europeia do Órgão

Sexta-feira, 7 de Outubro – 21:30h Sé Patriarcal de Lisboa
Johann Sebastian Bach
Wolfgang Zerer – órgão

Sábado, 8 de Outubro – 21:30h Igreja de São Vicente de Fora
Música Antiga Alemã
Wolfgang Zerer – órgão

Domingo, 9 de Outubro – 11:30h Igreja de São Vicente de Fora
Missa do Festival
Capella Basilicae Martyrum Olisiponensis
Armindo Borges – direcção
Antoine Sibertin-Blanc – órgão

Domingo, 9 de Outubro – 16:30h Basílica da Estrela
Música Antiga Italiana
Roberto Antonello – órgão

Segunda-feira, 10 de Outubro – 21:30h Sé Patriarcal de Lisboa
Concerto de Encerramento
Música Coral e Sinfónica de Luís de Freitas Branco
Ana Ferraz – soprano
Susana Teixeira – meio-soprano
Pedro Chaves – tenor
António Esteireiro – órgão
Coro de Câmara de Lisboa
Orquestra Sinfónica Juvenil
Christopher Bochmann – direcção

fonte: http://www.jmp.pt/festivaldeorgao/

Os militares que nos cobrem de vergonha

"Nesta época de dissolução, em que tão afrouxados estão os laços da disciplina"(carta de Mouzinho de Albuquerque ao príncipe real D. Luís Filipe), o Exército português entrou ao serviço de Júlia Pinheiro e de José Castelo Branco. É de bradar aos céus. O completo achincalhamento das nossas Forças Armadas, aquilo a que se assistiu domingo à noite na TVI. Mesmo que os oficiais venham agora dizer que passaram antecipadamente à reserva, eles lá estiveram, fardados, a brincar aos exércitos com Valentina Torres e Alexandre Frota, numa televisão em vias de vir a ser espanhola. Para quê o sangue derramado em Aljubarrota e o levantamento de 1640? Para tudo acabar às ordens da mulher do burro e do consorte da lady? Haja vergonha, senhores, haja decoro! Isto não pode ficar impune.

Jorge Heitor

Lisboa

Portugal

ano de 2005

quinta-feira, setembro 15, 2005

CABINDA

Em «Unica Semper Avis» foi adicionada a seguinte referência bibliográfica na página dedicada a CABINDA, e para a qual chamamos a atenção dos nossos leitores:

PORTO, João Gomes, "Cabinda Notes on a soon-to-be-forgotten war", Occasional Paper 77, Institute for Security Studies, August 2003 [em linha]. [consulta em 15.9.2005]<http://www.iss.co.za/pubs/papers/77/Paper77.html>

quarta-feira, setembro 14, 2005

708 anos sobre o Tratado de Alcanices

Na sequência de esclarecida política diplomática, o Rei D. Dinis assinou com o Rei de Castela, em 12 de Setembro de 1297, o Tratado de Alcanices, pelo qual se fixou a fronteira entre os dois Estados peninsulares, sendo reconhecida a soberania portuguesa sobre os territórios e povoações de Riba-Côa, Ouguela, Campo Maior e Olivença.

Os limites então estabelecidos jamais sofreram qualquer alteração, assim se constituindo a mais antiga e estabilizada fronteira nacional da Europa.

Todavia, o Estado vizinho, que em diversas ocasiões e sob variadíssimas formas questionou a existência de tais limites, ocupou, em 1801, a vila portuguesa de Olivença. Ocupação esta que permanece, indignamente, apesar das determinações e acordos internacionais (designadamente o Tratado de Viena de 1815), apesar dos próprios compromissos assumidos pelo Estado espanhol, apesar do Direito
Internacional.

Na passagem de 708 anos sobre o Tratado de Alcanices, o Grupo dos Amigos de Olivença, denuncia - como sempre o fez desde a sua fundação por Ventura Ledesma Abrantes, oliventino refugiado em Portugal, há mais de 68 anos - a ocupação daquela parcela de Portugal.

Esta associação de cidadãos que não abdicam do exercício dos seus inalienáveis direitos de intervenção pública - continuando o testemunho de tantos vultos que pugnaram pela portugalidade de Olivença, como Hipólito Raposo, Hernâni Cidade, Jaime Cortesão, Queiroz Veloso, Torquato de Sousa Soares, General Humberto Delgado, Miguel Torga, Ricardo Rosa e Alberty - reclama-se, muito simplesmente, daquela que é a posição jurídico-política portuguesa, com cobertura constitucional: Portugal não reconhece legitimidade à ocupação de Olivença por Espanha, considerando que o
território é português de jure.

No momento em que se apresentam diversos candidatos a Presidente da República - garante da Independência Nacional - espera-se deles a iniciativa de trazer a debate a Questão de Olivença e a capacidade de apresentar um programa nacional para a sua resolução.

O Grupo dos Amigos de Olivença prosseguirá animosamente os seus esforços pelo reencontro com Olivença, no respeito pela História, pela Cultura, pela Moral e pelo Direito.

Que os cidadãos portugueses, por todos os meios, exijam que a Questão de Olivença seja colocada na agenda política nacional!

Lisboa, 12-09-2005.

A Direcção do Grupo dos Amigos de Olivença


www.olivenca.org

terça-feira, setembro 13, 2005

Insucesso Escolar em Portugal

António da Cunha Duarte Justo(*)

A situação escolar em Portugal é catastrófica. Isto é confirmado a nível internacional pelo Estudo-PISA da OCDE e pelos últimos dados estatísticos fornecidos pelo Ministério da Educação (GLASE) sobre o insucesso escolar em Portugal nos últimos nove anos.

Os resultados do Teste PISA que compara o rendimento escolar dos alunos em 40 países tem sido sucessivamente um testemunho, a alto nível, da ineficiência do nosso sistema escolar. Portugal ocupa na lista das nações estudadas um lugar baixíssimo. Dos 40 países investigados, os alunos portugueses encontram-se no 30° lugar em Matemática, 28° em Leitura e 32° em Ciências Naturais.

Dos valores apresentados pelo ME (GLASE) relativos ao período que vaí de 1994 a 2003, a situação é gritante. Torna-se mais evidente atendendo aos destinos individuais não referidos. Assim, em 2003, do milhão e meio de estudantes do ensino básico e secundário que frequentavam as escolas portuguesas, 280.000 alunos reprovavam. A percentagem de retenção escolar no ensino básico até ao 9° ano foi constante (13%) nos 9 anos estudados.

A taxa de retenção e de desistência no ensino secundário (10.° ao 12.°) ainda foi maior, verificando-se uma média de 34,33 % relativa ao período de referência. Um em cada três alunos chumba. Em 2003 mesmo 43,5 % dos alunos do 12° não faziam todas as disciplinas, culminando o ensino tecnológico com 53,6 por cento de chumbos.

Uma Nação em agonia e ninguém se interessa

Uma catátrofe a nível individual e nacional se atendermos aos destinos individuais e aos prejuízos económicos nacionais aderentes à situação. Para quem sabe ler, isto significa um atestado de incompetência a todo o sistema escolar a nível de estruturas e de recursos humanos. Uma hipoteca para o futuro num país que irresponsavelmente tem vivido para inglês ver. Onde está a voz dos intelectuais, dos políticos e dos jornalistas? Que preparação levam os alunos para um mundo em mudança, cada vez mais competitivo e global? Que sociedade resultará de uma elite portuguesa medíocre?

No estudo nota-se um desaferimento crasso na passagem de um ciclo para o outro: se no fim do 1° ciclo do Ensino Básico (4° ano) chumbam 8,4 %, no 5° ano chumbam 14,9%; no 6° ano, fim do 2° ciclo, chumbam 14,6% e no 7°ano, início do terceiro ciclo do Ensino Básico, chumbam 24,4%; se no 9° ano ficam retidos 15%, no início do Ensino Secundário, no 10° ano, chumbam 34,8%. O que ressalta com evidência destas percentagens é a falta de aferimento e de díálogo entre as escolas (ou ciclos) que passam os seus alunos de um estabelecimento ou de um ciclo para o outro. A mão esquerda não sabe o que faz a direita.

O conjunto dos dados, tanto da Administração Portuguesa, como da organização internacional responsável por PISA, apontam para uma conclusão, ou melhor, para um diagnóstico: existe uma administração deficiente que se limita a administrar a miséria; sindicatos apenas interessados em defender os interesses pontuais dos docentes; uma classe política irresponsável e adormecida, desinteressada do futuro dos educandos e da nação.


De Crise em Crise : Tal Escola, Tal Nação
Urgência duma Comunidade Educativa

Um dos grandes males das sociedades modernas é a falta de disciplina e de conceitos concludentes. Se este é um problema internacional a questão em Portugal eleva-se à terceira potência. Vai sendo tempo de despertar, investindo na nossa identidade e deixando de olhar para os outros como exemplo, tal como faziamos nos séculos preparatórios da nacionalidade e dos descobrimentos. Para voltarmos a dar novos mundos ao mundo temos que nos deixar de estrangeirismos, tornando-nos mais portugueses, mais universais. A salvação não vem de fora nem de ladainhas muitas vezes repetidas por ideologias de segunda mão. Apostemos nas raízes da nossa cultura e na tradição que nos tornou grandes.

Um novo Perfil de Professor – Cada Escola com um Perfil próprio

Na nação como na escola não chegarão professores empenhados na sua disciplina, mas professores pessoalmente empenhados numa relação pessoal professor-aluno, numa relação pessoal de comunidades: comunidade docente e comunidade discente; não chega o diálogo é preciso relação e comunhão íntima. Na relação de um eu-tu consciente de que o próprio eu nasce de um tu.

Urge que a escola deixe de ser um sumatório de indivíduos, uma massa amorfa de pastores e ovelhas não identificados e desmotivados. A comunidade nasce de pessoas capazes de assumir responsabilidades e exercita-se na responsabilidade comunitária escolar em serviço mútuo, na autoconsciência e na capacidade de poder adiar a satisfação imediata. A comunidade escolar terá que se preocupar com a terceira coluna: a comunidade dos pais, a terceira coluna da comunidade educativa. A escola precisa de ideias claras e valores assentes; menos dever e mais ser. Todos os intervenientes terão que trabalhar na elaboração de um conceito de educação consensual à margem de partidarismos e de ideologias; neste sentido não se poderão culpar individualmente os pais pelos diferentes hábitos e sistemas educativos, atendendo a que partidos e ciência os tem considerado cobaias e presas. Cada escola precisa de menos regulamentação e de um perfil que a distinga das outras, com um sentimento de pertença, uma identidade própria, em que alunos e professores falem da sua escola de modo semelhante ao daqueles que falam do seu grupo de futebol ou do seu grupo de música. A falta de perfil das escolas é uma consequência de responsabilidades delegadas e deve-se tanto à rotina como a ideologias da moda assim como a um experimentalismo leviano, tudo isto baseado no abdicar da própria identidade.

Nesta Europa desorientada e confusa e em Portugal não há um consenso político nem científico de como educar, tornando-se a escola presa fácil de ideologias partidárias ou de experimentalismos precoces. Há muito que Portugal se encontra num processo de tranformação de valores em que, em nome de uma liberdade que não existe, se negam rituais, disciplina, ordem, educação... Parece querer-se um campo pedagógico frágil. É também fatal um espírito modernista mal entendido contra elites. Precisa-se uma nova educação: educar para elites responsáveis e não para craques ou afortunados que se alistam numa ou noutra organização, seja ela partidária, maçónica, futebolística ou religiosa; não chega uma elite de postos. Em pedagogia não há nada de novo que já não fosse expresso num ou noutro método já velho. As ciências da pedagogia e da psicologia necessitam de independência, deixando de estar ao serviço de ideologias ou modas. A escola tem qu se tornar num centro de vida e de interesses comprometedores em que a palavra relação seja honrada. O docente, mais do que um cientista, é um educador. A sua formação tem de ser mais completa e a sua escolha tem que obedecer a critérios mais rigorosos. O critério de funcionário público tornou-se anacrónico numa sociedade moderna e democrática. Não deveria ser prioritária a motivação pela segurança do funcionário público. A este sistema público estão inerentes vícios de classe acrescentados dos vícios próprios da administração que se inclina a conservar.

Saber, juventude, e um pouco de ingenuidade e de didática, não são suficientes para se formarem homens e mulheres conscientes e responsáveis na realização de um sonho e de uma realidade pessoal e nacional... Não se trata apenas de transmitir saber e de avaliar o aluno. Este tem que descobrir-se como consciência num processo de crescimento sem fim. Mais que nas classificações, o padrão de avaliação e de medição da actividade de professor/aluno deve verificar-se no desenvolvimento da personalidade e das competências específicas de cada aluno, à sua medida e da comunidade.

Rigor não exclui solicitude e encorajamento. Mais relação e respeito e menos medo e hierarquia. Um projecto consciente exige mais dos professores e dos alunos. A disciplina é a base de uma liberdade responsável.

O sentido da personalidade, o respeito mútuo, e a consciência de nos encontrarmos a caminho duma transcendência que supera a nação, são, entre outros valores cristãos, meios avalizados e provados ao longo da nossa história e que podem e devem tornar-se objecto de estudo análise e aplicação.

Um cultura iconoclasta que apenas substitui os seus santos de igreja pelos santos ou corifeus da ideologia, da literatura, da cultura ou da política, não passa de uma cultura de beatas, que se engana a si própria: imagens de imagens; e os seus corifeus: cegos guiando outros cegos...

Professores, políticos, jornalistas, já vai sendo tempo de deixarmos de jogar às escondidas com o povo e com a nação. Até quando teremos de continuar a ser um povo de fugida?...


* Professor de Língua e Cultura Portuguesas na Alemanha