DO ORÁCULO DA POLIS
Por Paulo Teixeira Pinto
As perguntas difíceis são as que concitam mais respostas. Assim também os maiores desafios são os que reclamam os homens melhores.
O maior segredo político de todos os tempos oculta-se sob uma única palavra: confiança. Mas o que pode levar alguém a confiar em outrem ao ponto de o escolher para mandar em si próprio?
Só há uma boa a razão para eleger um líder: conquistar e exercer o poder. Tudo o resto que venha a ser alcançado poderá ser muito meritório mas é evidentemente irrelevante para este jogo. E quem falha no essencial também não serve para o acessório.
Política é a distância que vai da mera gestão da conveniência pessoal ou tribal à real opção pelo bem comum. Assente isto, haja ânimo. Sem esquecer que também na política o exemplo é a melhor de entre todas as lições.
Há duas categorias de problemas que não devem interessar à política: aqueles que o tempo resolve e aqueles que nem o tempo resolve.
A política é talvez a única actividade humana em que a estupidez é tão ou mais perigosa e nociva do que a maldade.
Primeiro devem identificar-se os adversários políticos. Só depois se podem reconhecer os amigos. Porque só estes sabem que persistir significa fazer o que é devido. E que lealdade não quer dizer que sim a tudo.
No fundo comum que habita na universalidade dos homens, regista-se o facto de cada um se acreditar como diferente de todos os outros. Mas esta realidade óbvia esconde-se no labirinto das impossibilidades em que uns e outros sonhamos.
É na sua concepção antropológica, ou seja, na imagem que o homem político tem de si mesmo, que se funda o núcleo da missão que ele se propõe dedicar a toda a sociedade.
Nunca há guerras boas. Mas todas começam por ter as suas causas. Que, aos olhos de quem as empreende, as tornam úteis ou necessárias. Para alguns poderão até ser justas. Mas são sempre más. Especialmente quando se perde a memória do porquê de terem começado.
A geopolítica perde sempre quando o que está em causa é mais do que a terra, a riqueza ou a força.
Aquilo que mais distingue o homem não é apenas a sua capacidade para pensar mas também a sua liberdade para dar. Logo, o homem político é tanto mais humano quanto mais capaz for de, pela sua vontade livre, ultrapassar a condição bestial que o aprisiona como predador.
Sem dúvida que as paixões aquecem os fundos do coração. Mas toldam os contrastes da visão. E o brilho da compreensão. Na política e também no resto.
Nenhuma revisão de regime ou mudança de sistema poderá mais do que o respeito pelos adversários contribuir para o restabelecimento de uma credibilidade mínima da política.
Ensina a natureza humana que também a política goza de uma face dupla – enquanto uns se comportam bem porque acreditam que o bem existe, e aceitam-no como princípio natural, outros só o fazem se e enquanto não puderem escolher o mal.
Na política só um conselho é útil: não abrandar nunca o exercício do que se é suposto dever fazer, nem por mau tempo ou má sorte. Mesmo com o óbice da inconveniência ou a dor da contestação. Porque os compromissos estão para os interesses como as consequências para as causas.
Assim como as convicções de cada um não podem ser um dogma para os demais, também uma criatura sem convicções seria como uma palavra sem letras.
Consta da própria definição das regras do jogo político que não há nunca empates. Só há dois resultados possíveis: perder ou ganhar. E o que se ganha é sempre algo que a prazo, por natureza, estará também inelutavelmente perdido - o poder.
Nada há de mais transitivo do que a sublimação da glória efémera. Quando se trata do poder só uma inocência comovente ou uma ambição doente conseguem ignorar esta precariedade.
Caminho recomendado: em vez do desvio das dificuldades e adversidades óbvias, que qualquer um sabe dizer onde estão, seguir directamente contra tais obstáculos.
Quando a matriz do que está em causa é inconciliável, só a mera coexistência pacífica pode ser erigida em ambição cimeira. Mas esta não é ainda a paz desejável. E, no entanto, tal requisito, que fica aquém do desejo, permanece para além do provável.
Há concepções políticas tão úteis como um relógio parado – embora este pelo menos esteja certo duas vezes por dia.
Nem sempre se pode ter razão. Os erros são uma fatalidade. Mas em política deve sempre saber-se o que se quer e só querer o que se sabe ou pode fazer. As hesitações ou inflexões não são sinal de ponderação mas quase sempre da sua falta.
O exercício do poder também se aprende - havendo bom senso.
Até à data, nenhum político terá ficado conhecido como formiga ou abelha, em símbolo perene da sua natureza laboriosa. Mas muitos são reconhecidos enquanto membros de um género. Desde os cães de guarda, pela protecção que conferem aos seus donos, às víboras, pelo veneno que destilam e pela forma sinuosa como se movem. E também há camaleões, dadas as mudanças de tonalidade conferidas pelo ambiente onde se escondem. Sem falar dos falcões e das pombas. Mas o caso mais estranho é o de uns que se transformam em quase-ciclóstomos, bichos sem coluna.
Por razões com aparência de algum mistério, a imagem do poder surge invariavelmente associada ao cavalo. Seja qual for o perfil dos detentores desse poder ou o teor das suas políticas. A expressão é sempre correcta e, consequentemente, nunca muda – “o cavalo do poder”. É pacífico que não resultaria bem ouvir confessar a ambição de montar o “burro do poder” ou o “porco do poder”.
A realidade política nunca pode ser a preto e branco – porque o branco não existe, pois que é o conjunto de todas as cores.
A verdade da política não reside em nenhuma imagem – está na velocidade que lhes dá movimento.
É louvável viver com e para a política. É censurável sobreviver só da política.
Também na política não há nada mais difícil do que a simplicidade.
A mais nobre das dimensões a que a política pode almejar é aquela mesma que radica na defesa do Homem enquanto tal. Porque não pode haver em nenhuma agenda política algum tópico mais relevante do que a pessoa humana.
Cada dia, uma acção útil para todos, todos os dias.
Dilema permanente: pode ser conveniente o que é desnecessário; mas o necessário pode ser altamente inconveniente. Posto isto, à questão sobre o que se ganha com o procedimento de optar pelas atitudes necessárias, a resposta certa é: nada, absolutamente nada, custe o que custar, a não ser o respeito devido aos outros mas também a si próprio.
Não há políticos bons que não sejam pessoas de bem. E estas não mandam dizer por terceiros o que não podem dizer por si, nem se escondem sob o silêncio ou o anonimato, porque têm rosto e nome próprios.
Os resultados das eleições frequentemente cominam a condenação de muitas promessas. Em resultado desta sentença, está sempre a aumentar o clube dos políticos que têm um grande futuro atrás de si.
As evidências não se declaram – ou se reconhecem, ou não. Mesmos nos dias pouco propícios a tais pronunciamentos de carácter e de simples lucidez.
Como em qualquer actividade humana, em política tudo pode ser copiado. Tudo, menos o talento, a sensibilidade e a vontade.
Hoje, a informação pode ser de todos. A imaginação permanecerá para sempre como exclusivo de uns raros.
Quem não souber conhecer o sofrimento solitário poderá provavelmente sobreviver por si, mas não saberá certamente viver solidário para com os outros.
É nos princípios que residem os fins últimos da Política.
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