por Fernanda Frazão
ANTÍLIA, também lhe chamavam. E foi porto sonhado de navegadores de descoberta.
Contou Fernando Colombo, o filho de Cristóvão Colombo, almirante de Espanha, que notícias dessa ilha perdida no Atlântico chegaram um dia à Madeira, notícias que fizeram nascer em seu pai desejos de partida e busca.
Muitas são as lendas referentes aos Açores que relatam a existência naquele local do Atlântico de uma enorme ilha, maravilhosa e estranha. As nove ilhas do arquipélago seriam para muitos, de acordo com essas lendas antiquíssimas, os restos de uma esplendorosa civilização que chega a ser ligada à mística Atlântida descrita por Platão.
Assim como o filho de Colombo nos deixou notícia do modo como ele soube da existência daquela ilha, também as cartas de marear anteriores aos descobrimentos marítimos sistemáticos e organizados traziam figurada a oeste de Portugal, no Atlântico Ocidental, uma enorme ilha a que estava aposta a designação de ilha das Sete Cidades. Segundo a tradição corrente, essa ilha era possuidora de riquezas fabulosas, quer de origem natural, quer manufacturadas pelo homem, que nela havia construído cidades indescritíveis. Por estas razões, desde o início da aventura as naus de descoberta apontaram as proas na sua direcção, com a finalidade de trazer para o Reino algumas riquezas e celebrarem pactos de amizade com os seus habitantes.
Conta a lenda que no tempo da invasão dos mouros de Tárique, no ano 711, um grupo de sete bispos fugiu da península com todos os cristãos que quiseram acompanhá-los. Embarcaram em navios, na foz do Douro, e partiram em busca de segurança e paz. Arrastados por uma terrível tempestade, os viajantes acabaram por dar por si frente a uma ilha deserta de aparência paradisíaca. Estabeleceram-se e dividiram o território em sete parcelas onde cada bispo fundou uma cidade com governo próprio.
Tão bem se acharam que, para evitarem a fuga dos habitantes que com eles haviam chegado, afundaram os barcos. Dali por diante, cada vez que uma embarcação chegava à ilha, por acaso, a tripulação era retirada e os barcos destruídos para que no mundo exterior não fosse possível saber-se da existência daquela ilha paradigmática.
Diz-se que as cidades eram enormes e bem delineadas. Os palácios tinham paredes de ouro maciço e estavam defendidos por fortificações construídas com gigantescos blocos cúbicos de pedra. A paz total que viviam possibilitava-lhes o estudo e a resolução de alguns problemas vitais e talvez por isso o trabalho do campo e a criação de gado desenvolviam-se a ritmos e em condições hoje desaparecidos. Os bispos inventaram mil mecanismos auxiliares do trabalho manual, suavizando assim as condições de vida e possibilitando a todos os habitantes um desenvolvimento espiritual e filosófico só possível numa civilização em que o ócio não é um luxo, mas um componente da vida diária. E as pessoas eram felizes e sem contendas.
O relato de Fernando Colombo diz-nos que aqueles navegantes chegados fortuitamente à ilha das Sete Cidades trouxeram ao infante D. Henrique um punhado de areia da praia, donde um ourives de Lisboa extraiu bastante ouro. E acrescenta que estes homens fugiram do Reino, quando face à análise da areia, o infante os mandou embarcar de novo em direcção à ilha fabulosa.
Mas a ilha fabulosa nunca mais foi achada pelos caminheiros das águas. Certo dia, não se sabe bem porquê, um enorme cataclismo assolou aquela ilha amada de Deus. A terra tremeu e fez desmoronar os maravilhosos palácios e muralhas das sete cidades, enquanto ondas alterosas se encarregavam de apagar da face do mar a imagem daquele paraíso. No seu lugar ficaram pequenos restos de terra escancarados para o céu em picos de fogo e lava.
Por isso, quando os Portugueses chegaram aos Açores só lá encontraram nove pequenos pedaços de paraíso, perdidos na imensidão do mar. Riquezas já não existiam e gente não sobrevivera à fúria dos elementos.
Tudo quanto restou foi a memória do paraíso fabuloso e duas belíssimas lagoas, uma verde, outra azul: a Lagoa das Sete Cidades.
- Do livro Lendas Portuguesas
Retirado da edição online de 25 de Maio de 2007 do Jornal
PORTUGAL ILUSTRADO, no endereço
http://home.eol.ca/~azorean/
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