por Teresa Maria Martins de Carvalho
De-repente aconteceu e os lisboetas ficaram chocados. Quarenta mil jovens cristãos (católicos, protestantes, ortodoxos) de vários países europeus, alguns de bem longe, da Polónia, da Ucrânia ou da Rússia, juntavam-se alguns dias em Lisboa, para rezarem, cantarem, meditarem, para se encontrarem uns com os outros, em sinal de paz, sob o auspício da Comunidade Ecuménica de Taizé. Um acordar espantado, alguma indignação, aqui e ali – Então o serviço dos pobres e dos doentes? É só isto, rezar e mais nada? Que espécie de cristianismo é este? E que espécie de jovens?
Alegres, simples, sem problemas com o cariz inusitado desta magna reunião. As paróquias e as famílias que os receberam – e foram todos recebidos por famílias! – já tinham sido preparadas para este evento que acharam extraordinariamente enriquecedor, espiritual e humanamente, tanto pela qualidade das celebrações e encontros e a extrema beleza dos cânticos e dos ambientes criados como dos participantes. Muito a custo, os media deram notícias, poucas imagens e fracas, num jornalismo incipiente e desajustado para poder agarrar este acontecimento e encará-lo como algo de diferente, esquisito, na vida pacata dos lisboetas, habituados às não-notícias das politiquices, do futebol ou da Casa P.
Mais. Lembro-me que no dia 14 do mês de Novembro passado se realizou nas Oficinas de S. José uma cerimónia para comemorar o dia do Leigo Missionário, em que mais de 100 pessoas, missionários leigos, assistiram à Missa do «envio» dos jovens que iam partir para as suas missões e que eram ali acompanhados por outros jovens voluntários (e não só muito jovens, alguns…) que já tinham voltado ou que iriam partir depois da preparação que estavam ainda a receber.
Foi distribuído uma folha informativa e um opúsculo elaborados pela Fundação Evangelização e Culturas em que, pela primeira vez em conjunto, se dava conta das várias instituições portuguesas que preparam os jovens missionários para a missão e os enviam. São quarenta e duas, essas instituições, desde as mais antigas, dos princípios dos anos 80 até aos mais recentes de 2000. Desde organizações universitárias como o Gas’África como às nascidas ao abrigo e alento de congregações religiosas, ou paróquias ou movimentos… Desde as mais conhecidas como "leigos para o desenvolvimento" como as mais simples, fruto de grupos juvenis.
Há mais de vinte anos que têm vindo preparando e enviando jovens, quer para férias missionárias – os mais novos! – quer universitários ou gente já maior que, antes de se estabelecerem em profissões, empregos ou com encargos familiares, oferecem dois anos da sua vida para irem, em missão, ajudando o próximo mais pobre, inserindo-se tanto em acções ligadas aos Bispos desses países para onde vão como em estruturas missionárias instaladas no terreno ou que vão instalar, em programas determinados e estudados.
Há vinte anos e até hoje já foram enviados para países como Cabo Verde, Angola, Guiné, S. Tomé e Príncipe, Brasil e Timor (em preferência lusófona acentuada, embora tenha havido outros destinos como a Índia, Tanzânia, África do Sul, Malavi e México).
A duração é variada, desde os 3 meses a mais de 11 meses, e já partiram, desde os anos 80 até agora, 1960 voluntários. Na volta 3% seguem a vida religiosa mas os outros 97%, inseridos no tecido social português, dão valioso testemunho da sua inesquecível experiência missionária.
Para mim que tenho o triste hábito de “resmungar” contra os jovens de hoje que são arrogantes, vândalos, excêntricos, ignorantes, libertos para o prazer imediato, sem horizontes, agarrados ao mito da juventude que empapa a sociedade e que os incita a que gozem tudo o que há para gozar enquanto se é novo, apoiados e incitados pelas industrias do espectáculo e da moda, diante destas descobertas, os jovens de Taizé e os missionários leigos, fico sem fala... E à admiração e regozijo de os ver e saber, desfaz-se o pessimismo e abre-se a possibilidade de um futuro generoso, confiante, fraterno, pacífico, espiritual.
Às vezes, é bom uma pessoa sentir-se desmentida, sentir-se “vencida”, mesmo quando as estatísticas nos dizem que a percentagem de jovens crentes se vem estiolando... Com estes, a esperança é possível.
Não só os admiramos pela coragem, generosidade, simplicidade, vontade de paz e de reconciliação, nestes gestos de fé convicta, orante e operante mas aqui lhe dedicamos uma saudação feita de espanto, alegria e gratidão.
Não é “geração rasca”, não é.
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