“Aqui jaz o famoso Nuno, o Condestável, fundador da Casa de Bragança, excelente general, beato monge, que durante a sua vida na terra tão ardentemente desejou o Reino dos Céus depois da morte, e mereceu a eterna companhia dos Santos. As suas honras terrenas foram incontáveis, mas voltou-lhes as costas. Foi um grande Príncipe, mas fez-se humilde monge. Fundou, construiu e dedicou esta Igreja onde descansa o seu corpo”.
Inscrição que existiria na pedra tumular da sepultura primitiva de D. Nuno Álvares Pereira, na Igreja do Carmo em Lisboa
Explicámos em artigos anteriores as razões pelas quais se deveria aproveitar a distinção feita por Sua Santidade o Papa ao elevar à categoria de Santo um dos nossos mais ilustres antepassados; as razões pelas quais o júbilo não se deveria quedar pelo povo católico e ainda as razões que acreditamos estarem na origem da falta de unidade por parte das forças políticas e de outras, cuja actuação nada tem de transparente, em promoverem quaisquer manifestações que saiam fora do âmbito religioso.
Também nos parece evidente que as razões que aduzimos para esta atitude dos políticos e que se fundam nas asneiras muito graves cometidas por alturas de 1974/75, no desprezo pelo nosso passado histórico, pela adopção de ideologias contrárias aos interesses nacionais, pelo jacobinismo militante e pelos próceres defensores da federalização dos países europeus, dificilmente serão assumidas publicamente pelas personalidades ou forças que as sustentam. Tal poderia espoletar debates ideológicos de desfecho incerto e acordar consciências adormecidas por acções de cariz apologético e,ou,intimidatório (vulgo lavagem ao cérebro desenfreada), mas falsas na sua essência.
Não, o principal ponto que sustentará a objecção política a comemorações alargadas com empenhamento dos órgãos do Estado irá ser o argumento de que, em Portugal, o Estado é laico e existem perfeitamente definidos e separados os poderes e aquilo que pertence a Deus e o que cabe a César. Ora sendo a canonização de Nuno Álvares um acto eminentemente religioso, a César não compete imiscuir-se nem tomar partido.
Para não dizer que não fazem nada, os representantes do Povo, apelidados de deputados, por proposta de alguns, aprovaram recente e maioritariamente, um voto de congratulação pelo sucedido, embora uma mão cheia deles se abstivessem – isto é, tanto lhes faz e dão ao desprezo – e outros tantos até votaram contra – ou seja estão tristes por um compatriota seu (partindo do princípio que se sentem portugueses …) tenha sido distinguido com uma honra, que eles certamente abominam mas que não deixa de ser uma honra.
Era assim como se alguns de nós fossemos votar contra pelo facto de Saramago ter recebido o Nobel, só por não gostarmos da criatura.
De qualquer modo o voto de congratulações não obriga a fazer nada…
É este argumento peco que deve ser desmontado e nem sequer é difícil fazê-lo. Vejamos:
Em primeiro lugar a própria distinção religiosa deve ser motivo de júbilo nacional e não apenas dos católicos, já que é o reconhecimento de uma coisa boa – mesmo para quem não tem Fé – e que tem uma expressão a nível mundial. Que “diabo”, não estamos a tratar de um condenado por um qualquer tribunal internacional… Se assim for, um dia que houver um judeu ou um muçulmano português que se distinga, numa área qualquer da cultura, do desporto, no campo científico, etc., os católicos não se devem regozijar por isso, ou não vão participar numa qualquer homenagem nacional que se lhe queira fazer?
Por outro lado Portugal é um país de grande tradição cristã e católica que nos vem da fundação da nacionalidade. Os portugueses foram um pilar da Cristandade e são grandemente responsáveis pela expansão da palavra do Deus que morreu na cruz, em todo o mundo. Hoje em dia a grande maioria do povo português ainda se diz católica e teve de alguma forma formação católica. Então os órgãos do Estado que representam a Nação politicamente organizada fingem não ter nada a ver com esta realidade? Assumem-se (não quer dizer que o sejam!) tão democráticos e, neste caso, a maioria não lhes diz nada? Mas isto tem alguma lógica?
Vejamos ainda outro aspecto de primordial importância: a dimensão do personagem. D. Nuno não é um cidadão cuja vida se tivesse confinado ao âmbito religioso, como são por exemplo, os casos da irmã Lúcia ou do bom do Padre Américo. D. Nuno é uma figura avantajada da História de Portugal, foi um grande comandante militar e um líder natural, cuja acção se repercutiu na política nacional, numa altura gravíssima em que a independência corria sério perigo; consubstanciou um conjunto raro de virtudes morais, cívicas e militares, absolutamente invulgar. Numa palavra é um exemplo para todos e que, justamente, a todos devia servir de inspiração. São raros os países no mundo que se podem orgulhar de terem figuras da sua igualha e nós em Portugal não fazemos nada?
Perdoarão os leitores, mas creio que os portugueses se etilizaram colectivamente numa festa qualquer que ninguém deu conta ainda que acabou e assim ficaram. Então a selecção nacional de futebol que não deixa de ser um grupo de atletas principescamente pagos, que estacionam nos melhores hotéis, fazem estágios com cozinheiros, massagistas, médicos, etc., e restante parafernália ao seu serviço, que nos custa os olhos da cara e que ano após ano só nos dão desgostos, são recebidos pelo PR, pelo Chefe de Governo, são cumulados de telegramas e atenções, têm multidões à espera e são objecto de cobertura mediática capaz de criar urticária nos mais pacatos cidadãos e uma figura da estirpe do Santo Condestável, que nos tem guiado desde o século XIV e continua actual, não merece aos portugueses mais do que uma nota exaltante da Conferência Episcopal? (honra lhe seja feita). Que grave doença moral e até degenerescência física terá atingido o antigo Reino, agora República de Portugal?
D. Nuno combateu o bom combate. Como julgamos que nada se passa por acaso, aguardamos esperançosos os sinais positivos que a graça da santificação augura.
João José Brandão Ferreira
TCor Pilav (Ref)
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