segunda-feira, janeiro 30, 2006

Carta-Resposta do Dr. Augusto Ferreira do Amaral ao semanário «O Independente»

Ex.ma Senhora
Drª Inês Serra Lopes
Ilustre Directora de
O INDEPENDENTE


Lisboa, 29 de Janeiro de 2006

Excelentíssima Senhora Directora

O número 924, de 27 de Janeiro de 2006 do afamado semanário que V. Exª dirige, inclui na página 43 a carta duma leitora identificada como "Isabel Silva", intitulada "Duarte Pio: Sua Alteza Real ilegítima", eivada de erros, que pela presente corrijo, em breve síntese. Como o Independente preza a verdade na informação, peço que esta minha carta seja publicada, a fim de que os vossos leitores, e entre eles a referida, não continuem a laborar nos mesmos erros.
1 – O Rei D. Miguel não foi filho bastardo.
A leitora invoca uma afirmação de Raul Brandão no livro El-Rei Junot como único fundamento para a afirmação caluniosa de que D. Miguel seria fruto de adultério da Rainha D. Carlota Joaquina e, portanto, não seria filho do Rei D. João VI. Simplesmente, como se lê na nota introdutória à edição de 1982 do dito livro, este, «mais que uma obra histórica, é uma obra literária». As referências a D. João VI são «pontos negativos para a definição da imagem do verdadeiro historiador»; e o comentador duvida de que Raul Brandão tenha «alguma vez pretendido sê-lo». Ora nunca foi consistentemente posto em causa que D. Miguel fosse filho de D. João VI. Nem mesmo seu irmão D. Pedro IV, comandando a guerra civil contra ele, invocou tal fundamento para sustentar que D. Miguel era usurpador do trono. De resto D. Miguel, ainda mesmo que não tivesse sido filho fisiológico de D. João VI, foi sempre, para a ordem jurídica portuguesa, filho legítimo, e não bastardo perfilhado.
2 – D. Duarte Pio é legítimo representante dos reis de Portugal.
Trata-se de um juízo consensual, em Portugal e no estrangeiro.
E decorre, sem qualquer margem para dúvidas, do capítulo IV, título V, da Carta Constitucional, que regia a sucessão do trono no termo da vigência da Monarquia.
Aí não existia, como em nenhuma outra norma portuguesa formalmente constitucional, qualquer preceito excluindo da sucessão no trono de Portugal D. Miguel, ou a sua descendência.
Com a morte de El-Rei D. Manuel II, em 1932, deixou de haver vivos descendentes legítimos portugueses de D. Maria II e de D. Pedro IV.
Assim, conforme o art. 88º da Carta, a sucessão na qualidade de Chefe da Casa Real passou à linha colateral. E na sucessão por linha colateral aplicavam-se os seguintes princípios:
- não podia suceder estrangeiro algum, e
- a sucessão haveria de ser deferida «pela ordem regular da primogenitura e representação, preferindo sempre a linha anterior às posteriores.»
Em 1932 a linha anterior era a da descendentes legítimos de D. Miguel I, visto que este foi, além de D. Pedro IV, o único filho varão de D. João VI com descendência.
Ora na descendência de D. Miguel I, o português primogénito varão, por linha anterior, era D. Duarte Nuno, filho do 2º casamento de D. Miguel (chamado D. Miguel II), que era filho primogénito varão de D. Miguel I.
Assim, coube a D. Duarte Nuno a chefia da Casa Real Portuguesa depois de 1932 - como foi, de resto, geral e pacificamente reconhecido - até morrer, em 1976.
D. Duarte Pio é português e filho primogénito de D. Duarte Nuno. Como tal, sucedeu-lhe nessa chefia a partir de 1976.
No entanto, mesmo que se entendesse – ao arrepio do direito constitucional vigente em 4 de Outubro de 1910 – que a linha da descendência de D. Miguel I não poderia suceder na referida chefia, mesmo assim, D. Duarte sempre teria a chefia da mesma casa, por ser o de melhor direito entre os descendentes portugueses de D. Pedro IV - por sua Mãe, D. Maria Francisca de Orléans e Bragança, filha do Chefe da Casa Imperial do Brasil, e por isso legítima trineta de D. Pedro IV, falecida em 1968.
3 – D. Duarte não aufere rendimentos da Fundação da Casa de Bragança.
A Casa de Bragança possuía um acervo grande de bens vinculados, que assim permaneceram, excluídos das regras gerais da sucessão, depois da abolição do morgadio e mesmo durante a 1ª República, que os respeitou. Quando D. Manuel II morreu, Salazar prepotentemente subtraiu esses bens ao seu normal e correcto destino e transmitiu-os para uma fundação, que instituiu por Decreto – a Fundação da Casa de Bragança – gerida por pessoas nomeadas pelos Governos e cujos rendimentos deixaram de ser fruídos, como deviam, pelo Chefe daquela Casa ou pela Família a quem, como bens privados, pertenciam.
D. Duarte não vive pois à conta de rendimentos daquela fundação, como seria seu direito se o ditador os não tivesse confiscado em 1933 por essa insólita arbitrariedade.
D. Duarte também não aufere de qualquer fonte pública os seus rendimentos.
Nada recebe do erário público. Ao invés: tem aplicado boa parte do seu rendimento pessoal em serviço do País, em causas de grande relevância nacional, como foi, exemplarmente, toda a persistente e intensa actividade que ao longo de anos desenvolveu, quase sozinho, pela causa da liberdade de Timor.
Compreendo que se seja adversário do pretendente ao trono. Não aceito é que calunie D. Duarte, imputando-se-lhe vantagens que ele não aufere nem nunca auferiu e negando-se-lhe o justo reconhecimento do muito que, pelo contrário, em termos nacionais, o País é credor de D. Duarte.

Antecipadamente grato, aproveito o ensejo para apresentar a V. Exª os meus melhores cumprimentos.

a) Augusto Ferreira do Amaral

1 comentário:

emilia maria disse...

Esta carta deveria ser divulgada.
Sou a favor da monarquia.
Penso que nos daria mais estabilidade.
Pelo menos poupávamos em eleições e outras coisas para presidente da república.
Basta olhar para os países europeus monárquicos e comparar conosco.
Poderia se fazer um referendo?