quarta-feira, janeiro 27, 2010

A verdade vem ao cimo


CARTA DO CANADÁ
Fernanda Leitão

            Assim como a 1ª República teve  pecados irremíveis, também esta república que por agora vivemos os tem tido. A que saíu do 5 de Outubro de 1910, herdeira directa e legítima do Regicídio,  não se limpará nunca do sangue derramado pelo chefe do estado e seu filho nem das cruéis perseguições movidas à Igreja e seus servidores, e menos ainda dos milhares de homens que, mal alimentados e mal armados, foram carne para canhão na Primeira Guerra Mundial para satisfação e orgulho de Afonso Costa e quejandos. Seguiu-se outra república intolerante, com ditadura, censura e polícia política, que bom caldo de cultura foi para a mediocridade que depois veio.
            Nesta outra república, saída do 25 de Abril de 1974, o pecado maior, e sem perdão, foi a descolonização, isto é, o abandono precipitado das colónias e os povos que ali viviam. Não é de louvar a guerra colonial que a ditadura podia e devia ter evitado, mas ela não podia justificar um abandono tão cobarde na forma e tão vil no conteúdo. Medíocres a quem interesses internacionais, e não apenas da União Soviética, deram força, foram os fautores e responsáveis perante a História desse abandono que se saldou por uma incalculável tragédia para milhões de portugueses de todas as raças.
            Porque todas as revoluções arrastam consigo o lixo da confusão e do arbítrio, da mentira e da estupidez, é garantido que se procura fazer silêncio sobre o que se passou. Mas, felizmente, tem havido pessoas corajosas e dignas que, pouco a pouco, têm investigado esse passado sombrio e o têm dado à estampa em livros que, evidentemente, não merecem as menções dos que andam a estrangular o jornalismo na forca do politicamente correcto. Que a terra lhes seja leve.
            Excelente exemplo de coragem e dignidade, de esforço e perseverança numa investigação que durou 20 anos, é a jornalista Leonor Figueiredo que, em 2009, publicou na editora Aletheia o livro FICHEIROS SECRETOS DA DESCOLONIZAÇÃO DE ANGOLA. É um documento sem preço sobre uma das maiores infâmias cometidas por esta república: o abandono de centenas de portugueses que, raptados ou presos pelas forças políticas que, em Angola, se opunham ao poder colonial português, sofreram as maiores sevícias nas masmorras e acabaram, muitos deles, por serem assassinados e atirados às valas comuns. Não foram em grande número os que conseguiram salvar-se desse inferno. Mas todos por igual foram esquecidos por este regime. O livro, documentado até à exaustão, não deixa lugar a dúvidas. Porque acredito no poder da palavra honrada, tenho a certeza que livros como este pesarão sobre o futuro.
            Tocaram-me dois casos que Leonor Figueiredo apurou. Um foi o da médica Maria Fernanda Matos Sá Pereira Ramalho, em serviço na Maternidade de Luanda, raptada e barbaramente assassinada por ter descoberto uma sinistra trapaça do partido que havia de ser poder no termo da guerra civil. É que, em 1975, em plena barafunda do PREC, a minha querida amiga Rita Rolão Preto Vieira de Brito procurou-me, numa angústia, por ter sabido que essa médica, sua afilhada, tinha desaparecido.  O outro caso relatado é o de Helder Neto, antigo preso político no Tarrafal que alguém que eu julgava amigo me enviou, na década de 60,  com o pedido de o ajudar a saír de Portugal. Assim fiz, com a ajuda de uma jornalista estrangeira. Pode quem me lê imaginar o que senti quando, em 1975, soube que Helder Neto era um dos principais torcionários da nova pide de Angola. Por este livro soube que acabou abatido a tiro.
            Este livro é um serviço prestado à verdade e a Portugal. 

1 comentário:

Carlos Las Heras disse...

D. Fernanda Leitão
Permita-me que apresente os meus mais sinceros respeitos.
Li o que disse da médica Dra. Maria Fernanda Matos de Sá pereira Ramalho.
Li o que disse do Hekder Neto.
Fui um dos Portrugueses que o MPLA raptou e manteve prisioneiro desde 18 de Agosto de 1975 até Julho de 1978. Fui muito amigo do João Ramalho e da esposa Dra. Maria Fernanda. Quando era miudo costumava deslocar-me a Alpedrinha para me banhar nas piscinas do Dr. Francisco Sá Pereira.
Eu estava lá quando a mataram para os lados do Cacuaco. Ela tinha desmascarado uma notícia do MPLA em que atribuia ao FNLA canibalismo, mostrando umas fotos no jornal de crianças. Afinal eram fetos mal formados que se encontravam do teatro anatómico da UL.
Quanto ao Helder Neto, foi ele que me prendeu e tirturou.
Gostaria de lhe pedir uma foto do Helder Neto se tiver e ma queira enviar. Fivar-lhe-ei muito grato
Carlos de Las Heras
carlos.heras1@gmail.com