segunda-feira, junho 28, 2010

Razão e violência


CARTA DO CANADÁ

por Fernanda Leitão

            Hoje é segunda-feira, 28 de Junho. O comandante da polícia de Toronto diz-nos que foram detidos mais de 900 manifestantes ontem e anteontem, durante a realização da cimeira do G-20. Teve de ser mesmo assim.
            O Canadá gastou um bilião de dólares para receber primeiro o G-8, na paradisíaca estância de Huntsville e depois também o G-20, o dos países emergentes, no centro histórico de Toronto. Esta zona da cidade ficou praticamente isolada, com altos tapumes por todo o lado. Batalhões da polícia e tropas especiais ocuparam solo e subsolo, enquanto nuvens de helicópteros vigiavam. Os bancos, os serviços, a maior parte do comércio, fecharam portas. Os largos milhares de pessoas que aqui trabalham e vivem noutros pontos da cidade, tiveram um fim de semana prolongado.  Os residentes desta zona abasteceram-se e remeteram-se às suas casas. Uns e outros refilaram com o que nos ia custar esta reunião internacional, torceram o nariz à cidade barricada e esquisita,  acharam que as autoridades tinham exagerado.
            Na sexta-feira, desfilaram 25 mil pessoas enquadradas por sindicatos, ONGs, associações. Soube-me bem ver logo à cabeça o Craig Kilburger, um menino cuja trajectória venho acompanhar desde os seus 10 anos, altura em que o seu pequeno coração se sentiu ferido ao saber que, no mundo, há milhões de crianças escravas. Fez a sua primeira angariação de fundos, mobilizados que foram os meninos todos do seu bairro, e criou uma obra de caridade na garagem da sua casa. Nunca mais parou e hoje preside a uma organização internacional que tem remido milhares de crianças. Estar o Craig ali, logo à frente da manifestação, era um bom sinal. Seguiam-no centenas de cartazes, milhares de pessoas entoando slogans contra o capitalismo selvagem, o governo conservador do Canadá, com todo o entusiasmo e liberdade. Tocava-se música, rufavam-se tambores, exibiam-se caricaturas dos mandões do mundo. Tudo com a maior ordem.  Foi uma magnífica demonstração de democracia.
            Mas, de súbito, apareceu uma nuvem de pessoas todas vestidas de negro, de cara tapada, munidas de matracas, barras de ferro, cocktails Molotov e outras peças incendiárias. Não berravam slogans, partiam tudo o que viam à frente, incendiavam carros da polícia, pulverizavam as vidraças dos bancos, dos cafés e outros comércios. Fugiram a toda a velocidade em direcção ao parlamento e, no vasto parque que o circunda, mudaram de roupa rapidamente, para de novo se introduzirem na manifestação. Afinal as autoridades tiveram razão ao proteger o centro da cidade, sabiam o que nós não sabíamos: que havia um gang criminoso, organizado, que podia aparecer. Apareceu e mostrou bem que o G-20 foi apenas um pretexto para os seus membros darem largas à falta de respeito pelo património colectivo, aos seus instintos criminosos. Não são democratas nem apreciam a democracia, embora comam à custa dela.  Pouco inteligentes, ainda por cima. É que têm hoje por inimigos os cidadãos de Toronto, esses que choraram ao ver o que aconteceu e aí estão a exigir justiça e severidade.  Para compreenderem isto os que me lêem, direi que Toronto, sendo embora uma cidade enorme, cosmopolita, a praça financeira do Canadá, é uma cidade calma, segura, amável, em que as pessoas sorriem e se saúdam.  Vivem aqui há muitos anos pessoas oriundas de  160 países e nunca tinha acontecido uma selvajaria destas.  Portanto, é a hora da justiça. 

1 comentário:

Drughi disse...

Caro amigo,

O problema é que muitas vezes essas manifestações são geradas por quem está engravatado. Pense que nem tudo é o que parece, mas para alguns tudo o que brilha é ouro.

Saudações