UMA HISTÓRIA DE D. JOÃO DA CÂMARA
Para prestar o seu exame de admissão, apresentara-se diante do júri do Conservatório, a que D. João da Camara pertencia, uma rapariga pálida e hesitante.
-Diga uns versos, pediu um dos examinadores.
-Não me lembro de nenhuns ...
-Então um trecho qualquer em prosa ...
-Também não sei..., retorquiu sumidamente.
O júri entreolhou-se, surpreso : apenas lhes restava reprová-la !
Por entre o embaraçoso silêncio, ouviu-se a voz suave de D. João da Câmara, de mãos atrás das costas e olhando a rua através das vidraças, murmurar numa inspiração quase divina, cheia de paz :
-Diga a Avé-Maria ...
Quando a rapariga pálida e hesitante terminou a sua vibrante prece, D.João da Cãmara benzeu-se lentamente ...
E no sossego daquela sala, ante a turbação dos comovidos professores, duas coisas tinham acontecido : a jovem Maria Matos - porque era ela, a rapariga pálida e hesitante - iniciava ali uma inesquecível carreira ; e o compadecido escritor, que devido à Arte se imortalizara já perante os homens, pela bondade uma vez mais afiançava à sua alma a vida eterna.
Sem comentários:
Enviar um comentário