Portugueses:
Estamos a viver mais um 1º de Dezembro, o dia em que se afirmou a vontade de independência nacional e os portugueses disseram “Nós somos livres e o nosso Rei é livre”.
Para nós, o 1º de Dezembro aconteceu uma vez e o 1º de Dezembro acontecerá sempre.
Mas hoje, vivemos um 1º de Dezembro diferente.
Cada vez mais portugueses enfrentam a angústia de não saber como cumprir os seus compromissos financeiros, e mesmo como irão pagar as despesas básicas das suas famílias.
A todos eles, quero manifestar a minha solidariedade.
Hoje, atingimos aquele limite em que Portugal tem uma economia em recessão e se esgotou a capacidade do Estado se financiar. Os sucessivos aumentos de impostos já não contribuem significativamente para aumentar a receita do Estado, porque as famílias e as empresas já não conseguem o suficiente para os comportar.
Hoje, tal como em 1640, mas devido à irresponsabilidade de alguns governantes da III República, a nossa política depende da vontade de estrangeiros. A população tem dado provas de grande civismo. Por isso, a todos os que se manifestam de forma cívica em favor de um Portugal mais justo e mais independente, quero manifestar o meu apoio.
Na crise presente, é justo que peçamos contas a quem nos colocou nesta situação de pré-falência e que se tentem recuperar fundos fraudulentamente desviados. Apoio os que pedem a criminalização por actos públicos de gestão danosa.
O princípio do estado de direito democrático é a base da nossa ordem pública. E esse princípio baseia-se na dignidade da pessoa humana e na afirmação de que o cidadão deve estar ao serviço do Estado e o Estado ao serviço da pessoa.
Mas, hoje, existem muitos privilegiados a beneficiar das chamadas “gorduras de Estado”. Muitos fornecimentos, contratações, parcerias público privadas e ajustes directos deveriam ser reavaliados à luz do interesse público, tal como revelado por auditorias do Tribunal de Contas.
Por isso, a todos os que exigem que o Estado respeite o direito, eu digo: a Instituição Real está convosco.
No estado democrático, os partidos políticos têm uma missão essencial a desempenhar. Mas seria útil que as pessoas de boa vontade se unam aqueles partidos que melhor defendam os seus ideais, para que melhor possam servir o País.
No entanto o exercício da cidadania não se limita à actividade partidária.
São, felizmente, muitas as Associações Cívicas que têm mobilizado as boas vontades com acções eficazes de solidariedade e caridade. São fundamentais para um futuro melhor. Deixemo-las trabalhar, em vez de perder tempo com críticas e insultos que nada ajudam a minorar o sofrimento de quem delas precisa.
Por seu lado a Causa Real e as dezenas de associações reunidas na Plataforma Activa da Sociedade Civil, criam sinergias entre milhares de pessoas dedicadas a implementar soluções para os problemas nacionais.
Quero declarar-lhes o meu pleno empenho nas causas que defendem.
Não esqueço que, nas redes sociais, muitos defendem a Instituição Real. E lanço um apelo para que passem do virtual ao real, colaborando com a Causa e que mais associações e pessoas se juntem a quem trabalha no campo cívico e humanitário com eficácia e generosidade.
Uma das razões que comprometem o nosso futuro é a baixa natalidade. O Estado português não favorece fiscalmente as famílias que têm filhos, não toma medidas eficazes que ajudem as mães solteiras, não facilita a adopção de crianças.
Perante o já chamado “inverno demográfico” da falta de natalidade, para mim, que acredito no direito à vida, é difícil aceitar que o Estado, com o dinheiro dos nossos impostos, subsidie o “aborto a pedido”.
Após mais de noventa mil “vítimas legais” em Portugal nos últimos cinco anos , é altura de percebermos que a lei actual é insustentável !
“ Uma Nação que mata os seus filhos não tem futuro “ disse a Madre Teresa de Calcutá.
Peço que se lembrem que sem renovação das gerações, o Estado não conseguirá honrar os compromissos financeiros, em particular as reformas de quem descontou para a Segurança Social.
Há muitos anos que venho denunciando o nosso modelo errado de “desenvolvimento sem progresso”, sem uma visão global do futuro.
Por todo o País, tenho encontrado exemplos de pequenos e grandes empresários de sucesso, alguns reconhecidos internacionalmente.
A burocracia estatal e a lentidão da justiça têm provocado graves entraves a quem quer produzir. Temos que exigir mais ao Estado. Mais responsabilidade, mais respeito pelos governados que o sustentam, e, acima de tudo, mais dignidade.
Precisamos urgentemente de um Estado moderno e eficiente, que assegure a nossa soberania e a ordem interna, garantindo a oferta de bens públicos em sectores essenciais e a regulação e estímulo à actividade económica nos restantes, de forma a propiciar o crescimento das empresas e a oferta de emprego. Precisamos de um Estado que seja o primeiro a dar o exemplo, pagando a tempo e horas, bem como assegurando que os investimentos e gastos públicos sejam racionais.
O Estado moderno não se pode substituir ao sector privado na criação de riqueza e não pode ceder à tentação de intervir em tudo.
O Estado social moderno deve dar apoio aos mais desfavorecidos. Quanto menores forem os desperdícios, maior será a proporção da riqueza que chegará a quem precisa.
Para isso, não podemos ter uma sociedade toda subsidiada; não podemos ter um sector empresarial subsídio-dependente.
Como representante e chefe da Casa Real Portuguesa, é esta a reforma de Estado que preconizo. Um Estado que siga e imponha o direito, um Estado que apoie os mais desfavorecidos, um Estado eficaz, um Estado que fomente o desenvolvimento, um Estado que olhe o futuro, um Estado de e para todos os portugueses.
Se as monarquias democráticas actuais existem e têm um papel fundamental é porque nelas o exemplo vem de cima.
Importa prestar atenção à clara demonstração das nossas verdadeiras capacidades que é dada pelo sucesso que os portugueses obtêm no estrangeiro!
Sem qualquer ajuda do Estado, e no cumprimento dos desígnios da Instituição Real, eu e minha mulher Isabel temo-nos deslocado a países da Europa e da Lusofonia para promover Portugal.
Foi assim no Grão–Ducado do Luxemburgo onde 25% da população activa é portuguesa.
Na Galiza, encontrei um vivo interesse pela língua portuguesa e pelas relações económicas e culturais connosco. A tão interessante e antiga fala de lá também é conhecida como “o português da Galiza”.
Em Roma, tivemos ocasião de homenagear personalidades das Casas Reais europeias empenhadas em acções de solidariedade.
E nos Estados Unidos convivemos novamente com a dinâmica comunidade portuguesa de Nova Jersey e Nova York.
Tive, ainda, a oportunidade de escutar do Sr. Presidente da República de Cabo Verde, palavras de encorajamento para que a CPLP possa evoluir politicamente no sentido de uma Confederação, ou de uma União, aproximando as nações irmanadas pela língua de Camões.
Encontrei a mesma disposição entre os governantes de vários países da CPLP, incluindo o Brasil.
Cada dia são mais os que perfilham a visão de que, juntos, os países de língua portuguesa podem e devem construir um destino comum que será melhor do que o que actualmente se configura em separado.
Neste 1º de Dezembro, aproxima-se a data em que celebramos o Natal. Não deixemos que esta data seja desvirtuada publicamente por apelos ao consumismo.
Façamos desta data um estímulo à nossa tradição de solidariedade e caridade, apoiando as instituições que organizadamente trabalham nesse sentido, como eu e a minha Família procuramos fazer.
Há mais de um século que a minha Família se encontra impedida de exercer a missão que desempenhou desde que Afonso Henriques foi aclamado “Rex Portugalorum“, Rei dos Portugueses.
No passado 5 de Outubro tive ocasião de me dirigir aos portugueses, celebrando a independência alcançada nesse dia de 1143, com o Tratado de Zamora.
Precisamos de regressar a esse nosso futuro. De agir como sempre soubemos fazer após os desastres do passado: regenerando Portugal mas em bases mais sólidas, aprendendo com os erros cometidos.
Apelo aos portugueses para que se unem e actuem noutro projecto, para um Portugal melhor.
Apelo aos jovens, nomeadamente os que se ausentaram, e a todos, lá como aqui, para que continuem a acreditar em Portugal.
Para essa nova etapa da História, aqui declaro que eu e a minha família estamos disponíveis e dispostos a servir Portugal nos cargos para que os portugueses nos desejarem.
Viva Portugal !
lusitana antiga liberdade
Nos liberi sumus; Rex noster liber est, manus nostrae nos liberverunt... [Nós somos livres; nosso Rei é livre, nossas mãos nos libertaram...]
domingo, dezembro 02, 2012
domingo, outubro 07, 2012
Mensagem de Dom Duarte de Bragança, 5 de Outubro de 2012
Portugueses,
Nesta hora difícil que Portugal atravessa, talvez uma das mais difíceis da nossa já longa história, afectando a vida das famílias portuguesas e dos mais desfavorecidos de entre nós, Eu, enquanto descendente e representante dos Reis de Portugal, sinto ser meu dever moral e obrigação política dirigir-vos uma mensagem profunda e sentida, como se a todos conseguisse falar pessoalmente.
Estamos a viver uma terrível crise económica, o nosso país vê-se esmagado pelo endividamento externo, pelo défice das contas públicas e pela decorrente e necessária austeridade.
O actual regime vigora há pouco mais de 100 anos, e muitos dos seus governantes, por acção ou omissão, não quiseram ou não foram capazes de evitar o estado de deterioração a que chegaram as finanças públicas. Tais governantes, é preciso dizê-lo de forma clara, foram responsáveis directos pela perda da soberania portuguesa e pelo descrédito internacional em que caiu Portugal, uma das mais antigas e prestigiadas nações da Europa. Sem uma estratégia de longo ou sequer de médio prazo, sem sentirem a necessidade de obedecerem a um plano estratégico nacional, não conseguiram construir as bases necessárias para um modelo de desenvolvimento politicamente são e economicamente sustentável, optando, antes, pelo facilitismo e pelo encosto ao Estado.
Infelizmente, o Estado, vítima também ele da visão curta com que tem sido administrado, tem permitido que se agravem as assimetrias regionais, que se assista à desertificação humana do nosso território e que fique cada vez mais fundo o fosso que separa os mais ricos dos mais pobres. Infelizmente, Portugal continua a ser dos países europeus com índices de desigualdade mais altos. Todos têm o direito de ver bem remunerado o esforço do seu trabalho, da sua criatividade, da sua ousadia e do seu risco, mas a ninguém pode ser cortada a igualdade de oportunidades. Agora, neste momento de particular gravidade, em que nos é pedido um esforço ainda maior, recordo que o Estado é sobretudo suportado pelo fruto do esforço, do trabalho dos portugueses e de muitas das empresas a quem os portugueses dão o melhor das suas capacidades. Todos eles são merecedores do respeito por parte de quem gere os nossos impostos, e é esse respeito, esse exemplo que se exige ao Estado. Não posso deixar de aplaudir a dedicação, a entrega e sobretudo a enorme boa vontade com que inúmeros funcionários públicos se dedicam a servir com dignidade o nosso país.
Mas este diagnóstico e estas constatações valem pouco, valem muito pouco, quando confrontados com as dificuldades com que muitos portugueses hoje se debatem. Um facto é incontornável: a crise está aí e toca-nos a todos, e com ela se vão destruindo postos de trabalho, se vai degradando o nível de vida das nossas famílias e se vão desprotegendo os mais frágeis. Não tenhamos ilusões: muitos são os que hoje só sobrevivem graças à imensa solidariedade de que o nosso povo ainda é capaz. Porque somos um povo generoso, gente de bem, somos um povo capaz de tudo quando nos unimos em torno de um objectivo comum.
Torna-se importante, por isso, lembrar que neste dia, há quase 9 séculos, contra todas as adversidades, nascia Portugal, uma nação livre e independente, fruto da vontade e sacrifício dum povo unido à volta do seu Rei.
Então, como agora, foi fundamental a existência de um projecto nacional, uma causa comum e desejada que a todos envolveu: grandes e pequenos, governantes e governados, homens e mulheres. Um projecto que tinha, acima de tudo, o Rei e os portugueses, unidos por um vínculo indestrutível, constantemente renovado e vencedor, um vínculo de compromisso que nos ajudou a ultrapassar crises avassaladoras no passado, e que se prolongou pelos séculos seguintes, sendo interrompida apenas em 1910.
Foi essa mesma comunhão, uma comunhão de homens livres, que permitiu a reconquista e o povoamento do território, bem como, mais tarde, a epopeia dos descobrimentos e a expansão de Portugal pelo mundo. Foi todo um Povo, o nosso Povo, que enfrentou, com coragem e determinação os mares desconhecidos, “dando, assim, novos mundos ao mundo”. Foi a gesta de todo um Povo que permitiu criar este grande espaço de língua e afectos da Lusofonia, vivido em pleno pelas nações nossas irmãs, hoje integradas na CPLP. E foi a renovação desse projecto que permitiu a restauração da nossa independência em 1640, neste local, naquela que foi uma verdadeira refundação nacional, só conseguida pelo esforço e sacrifício dos Portugueses de então.
É pois este o desafio que temos hoje pela frente: refundar um projecto nacional capaz de unir todos os Portugueses de boa vontade, com o objectivo de reerguer Portugal, devolvendo a esperança e o orgulho a cada português. Esse projecto mobilizador é imprescindível para que cada um de nós possa ambicionar ter uma vida normal, socialmente útil, para que possa ser promovido pelo mérito e pelo esforço do seu trabalho, criar uma família e contribuir, cada um na sua medida, para o engrandecimento de Portugal.
Para que este projecto nacional seja possível, teremos de repensar o actual sistema político e as nossas instituições, procurando alcançar uma efectiva justiça social e a coesão económica e territorial, aproximando os eleitos dos eleitores.
Devemos também considerar as vantagens da Instituição Real, renovando a chefia do Estado para restaurar o vínculo milenar que sempre uniu os portugueses ao seu Rei.
O Rei interpreta o sentir da Nação, e age apenas pelo superior interesse do país, e nenhum outro interesse deve também mover os actores políticos. Portugal precisa de autoridade moral, de união em torno de um ideal, Portugal precisa de um projecto que seja o cimento em torno da Nação – a política e, acima dela, a Coroa, deve procurar sempre servir esse ideal, e nunca servir-se dele em benefício próprio.
É num sistema político, moderno, democrático, que a Chefia de Estado, isenta como tem de estar de lutas políticas e imbuída de uma autoridade moral que lhe advém do vínculo indestrutível e milenar com os portugueses, pode e deve zelar pelo bom funcionamento das instituições políticas, assegurando aos portugueses a sua eficácia e transparência. É a mesma Chefia de Estado que pode e deve apoiar a acção diplomática do Governo com o elo natural que a liga aos países lusófonos e a muitos dos nossos congéneres europeus. Acredito que só é possível debater a integração europeia, na sua forma e conteúdo, em torno de um elemento agregador: a agenda própria de um país multisecular na Europa, mas também com continuidade linguística, histórica, social, patrimonial e empresarial em geografias distantes. É o Rei que, personificando a riqueza da nossa história e cultura, é o último garante da nossa independência e individualidade enquanto Nação.
Portugal, nação antiga, com um povo generoso e capaz de grandes sacrifícios, sê-lo-á ainda mais se encontrar no Estado e nos seus representantes o exemplo de cumprimento do dever, de assunção dos sacrifícios e de sobriedade que os tempos de hoje e de sempre exigem.
Unidos e solidários num renovado projecto nacional que devolva a esperança aos Portugueses, reencontrados com uma instituição fundacional – a Instituição Real – sempre isenta e centrada no bem comum, então todos nós Portugueses – em Portugal ou espalhados pelo mundo através das vivíssimas comunidades emigrantes – com a grandeza de alma de que sempre fomos capazes nas horas difíceis, estaremos dispostos aos necessários e equitativos sacrifícios que a presente hora impõe. Em nome do futuro de todos os que nos são queridos, filhos e netos. Numa palavra: em nome de Portugal.
Não duvido que, aconteça o que acontecer, os Portugueses, com calma, ponderação e perseverança, saberão lutar para continuar a merecer o seu lugar na história e no concerto das nações. Eu e a minha Família – assim os Portugueses o queiram – saberemos estar à altura do momento e prontos para cumprir, como sempre, o nosso dever, que é só um: servir Portugal.
Existe uma alternativa muito clara à actual situação a que chegou a este regime, alternativa que passa por devolver a Portugal a sua Instituição Real e que, se não resolve por si só todos os nossos problemas actuais, será certamente – como o provam os vários países europeus que a souberam preservar – um grande factor de união popular, de estabilidade política e de esperança coletiva. Numa palavra, de progresso.
Portugal triunfará! Assim saibamos unir esforços, assim saiba cada um de nós, de forma solidária, dar o melhor de si mesmo, não esquecendo nunca os que mais sofrem e os que mais precisam. Que ninguém duvide: somos uma nação extraordinária, e o valor e a coragem do nosso povo serão a chave do nosso sucesso.
Viva Portugal!
Nesta hora difícil que Portugal atravessa, talvez uma das mais difíceis da nossa já longa história, afectando a vida das famílias portuguesas e dos mais desfavorecidos de entre nós, Eu, enquanto descendente e representante dos Reis de Portugal, sinto ser meu dever moral e obrigação política dirigir-vos uma mensagem profunda e sentida, como se a todos conseguisse falar pessoalmente.
Estamos a viver uma terrível crise económica, o nosso país vê-se esmagado pelo endividamento externo, pelo défice das contas públicas e pela decorrente e necessária austeridade.
O actual regime vigora há pouco mais de 100 anos, e muitos dos seus governantes, por acção ou omissão, não quiseram ou não foram capazes de evitar o estado de deterioração a que chegaram as finanças públicas. Tais governantes, é preciso dizê-lo de forma clara, foram responsáveis directos pela perda da soberania portuguesa e pelo descrédito internacional em que caiu Portugal, uma das mais antigas e prestigiadas nações da Europa. Sem uma estratégia de longo ou sequer de médio prazo, sem sentirem a necessidade de obedecerem a um plano estratégico nacional, não conseguiram construir as bases necessárias para um modelo de desenvolvimento politicamente são e economicamente sustentável, optando, antes, pelo facilitismo e pelo encosto ao Estado.
Infelizmente, o Estado, vítima também ele da visão curta com que tem sido administrado, tem permitido que se agravem as assimetrias regionais, que se assista à desertificação humana do nosso território e que fique cada vez mais fundo o fosso que separa os mais ricos dos mais pobres. Infelizmente, Portugal continua a ser dos países europeus com índices de desigualdade mais altos. Todos têm o direito de ver bem remunerado o esforço do seu trabalho, da sua criatividade, da sua ousadia e do seu risco, mas a ninguém pode ser cortada a igualdade de oportunidades. Agora, neste momento de particular gravidade, em que nos é pedido um esforço ainda maior, recordo que o Estado é sobretudo suportado pelo fruto do esforço, do trabalho dos portugueses e de muitas das empresas a quem os portugueses dão o melhor das suas capacidades. Todos eles são merecedores do respeito por parte de quem gere os nossos impostos, e é esse respeito, esse exemplo que se exige ao Estado. Não posso deixar de aplaudir a dedicação, a entrega e sobretudo a enorme boa vontade com que inúmeros funcionários públicos se dedicam a servir com dignidade o nosso país.
Mas este diagnóstico e estas constatações valem pouco, valem muito pouco, quando confrontados com as dificuldades com que muitos portugueses hoje se debatem. Um facto é incontornável: a crise está aí e toca-nos a todos, e com ela se vão destruindo postos de trabalho, se vai degradando o nível de vida das nossas famílias e se vão desprotegendo os mais frágeis. Não tenhamos ilusões: muitos são os que hoje só sobrevivem graças à imensa solidariedade de que o nosso povo ainda é capaz. Porque somos um povo generoso, gente de bem, somos um povo capaz de tudo quando nos unimos em torno de um objectivo comum.
Torna-se importante, por isso, lembrar que neste dia, há quase 9 séculos, contra todas as adversidades, nascia Portugal, uma nação livre e independente, fruto da vontade e sacrifício dum povo unido à volta do seu Rei.
Então, como agora, foi fundamental a existência de um projecto nacional, uma causa comum e desejada que a todos envolveu: grandes e pequenos, governantes e governados, homens e mulheres. Um projecto que tinha, acima de tudo, o Rei e os portugueses, unidos por um vínculo indestrutível, constantemente renovado e vencedor, um vínculo de compromisso que nos ajudou a ultrapassar crises avassaladoras no passado, e que se prolongou pelos séculos seguintes, sendo interrompida apenas em 1910.
Foi essa mesma comunhão, uma comunhão de homens livres, que permitiu a reconquista e o povoamento do território, bem como, mais tarde, a epopeia dos descobrimentos e a expansão de Portugal pelo mundo. Foi todo um Povo, o nosso Povo, que enfrentou, com coragem e determinação os mares desconhecidos, “dando, assim, novos mundos ao mundo”. Foi a gesta de todo um Povo que permitiu criar este grande espaço de língua e afectos da Lusofonia, vivido em pleno pelas nações nossas irmãs, hoje integradas na CPLP. E foi a renovação desse projecto que permitiu a restauração da nossa independência em 1640, neste local, naquela que foi uma verdadeira refundação nacional, só conseguida pelo esforço e sacrifício dos Portugueses de então.
É pois este o desafio que temos hoje pela frente: refundar um projecto nacional capaz de unir todos os Portugueses de boa vontade, com o objectivo de reerguer Portugal, devolvendo a esperança e o orgulho a cada português. Esse projecto mobilizador é imprescindível para que cada um de nós possa ambicionar ter uma vida normal, socialmente útil, para que possa ser promovido pelo mérito e pelo esforço do seu trabalho, criar uma família e contribuir, cada um na sua medida, para o engrandecimento de Portugal.
Para que este projecto nacional seja possível, teremos de repensar o actual sistema político e as nossas instituições, procurando alcançar uma efectiva justiça social e a coesão económica e territorial, aproximando os eleitos dos eleitores.
Devemos também considerar as vantagens da Instituição Real, renovando a chefia do Estado para restaurar o vínculo milenar que sempre uniu os portugueses ao seu Rei.
O Rei interpreta o sentir da Nação, e age apenas pelo superior interesse do país, e nenhum outro interesse deve também mover os actores políticos. Portugal precisa de autoridade moral, de união em torno de um ideal, Portugal precisa de um projecto que seja o cimento em torno da Nação – a política e, acima dela, a Coroa, deve procurar sempre servir esse ideal, e nunca servir-se dele em benefício próprio.
É num sistema político, moderno, democrático, que a Chefia de Estado, isenta como tem de estar de lutas políticas e imbuída de uma autoridade moral que lhe advém do vínculo indestrutível e milenar com os portugueses, pode e deve zelar pelo bom funcionamento das instituições políticas, assegurando aos portugueses a sua eficácia e transparência. É a mesma Chefia de Estado que pode e deve apoiar a acção diplomática do Governo com o elo natural que a liga aos países lusófonos e a muitos dos nossos congéneres europeus. Acredito que só é possível debater a integração europeia, na sua forma e conteúdo, em torno de um elemento agregador: a agenda própria de um país multisecular na Europa, mas também com continuidade linguística, histórica, social, patrimonial e empresarial em geografias distantes. É o Rei que, personificando a riqueza da nossa história e cultura, é o último garante da nossa independência e individualidade enquanto Nação.
Portugal, nação antiga, com um povo generoso e capaz de grandes sacrifícios, sê-lo-á ainda mais se encontrar no Estado e nos seus representantes o exemplo de cumprimento do dever, de assunção dos sacrifícios e de sobriedade que os tempos de hoje e de sempre exigem.
Unidos e solidários num renovado projecto nacional que devolva a esperança aos Portugueses, reencontrados com uma instituição fundacional – a Instituição Real – sempre isenta e centrada no bem comum, então todos nós Portugueses – em Portugal ou espalhados pelo mundo através das vivíssimas comunidades emigrantes – com a grandeza de alma de que sempre fomos capazes nas horas difíceis, estaremos dispostos aos necessários e equitativos sacrifícios que a presente hora impõe. Em nome do futuro de todos os que nos são queridos, filhos e netos. Numa palavra: em nome de Portugal.
Não duvido que, aconteça o que acontecer, os Portugueses, com calma, ponderação e perseverança, saberão lutar para continuar a merecer o seu lugar na história e no concerto das nações. Eu e a minha Família – assim os Portugueses o queiram – saberemos estar à altura do momento e prontos para cumprir, como sempre, o nosso dever, que é só um: servir Portugal.
Existe uma alternativa muito clara à actual situação a que chegou a este regime, alternativa que passa por devolver a Portugal a sua Instituição Real e que, se não resolve por si só todos os nossos problemas actuais, será certamente – como o provam os vários países europeus que a souberam preservar – um grande factor de união popular, de estabilidade política e de esperança coletiva. Numa palavra, de progresso.
Portugal triunfará! Assim saibamos unir esforços, assim saiba cada um de nós, de forma solidária, dar o melhor de si mesmo, não esquecendo nunca os que mais sofrem e os que mais precisam. Que ninguém duvide: somos uma nação extraordinária, e o valor e a coragem do nosso povo serão a chave do nosso sucesso.
Viva Portugal!
segunda-feira, abril 30, 2012
As palavras proibidas
Carta do Canadá
por Fernanda Leitão
Quando assentei praça no jornalismo, no século passado, a comunicação social era mantida com trela curta e açaime pela censura. Esta era uma coisa misteriosa, sinistra e caricata, personificada por uns coronéis tarimbeiros sobrados do 28 de Maio de 1926. Eram engraçados, os coronéis da censura. Um grupo de universitários que eu conheci, pontificado por um que veio a ser médico em Moçambique, resolveu editar uma revista, isto em Coimbra, para o que montou um elaborado plano de pega de cernelha à censura. Como o militar que naquela cidade chefiava a censura ia todos os dias tomar a bica à mesma hora, a rapaziada foi-se-lhe chegando,mansa e sonsa, numa conversa mole que encantava o tropa. Quando acharam que o bicho estava pronto para a pega, apareceram-lhe com as provas da revista para a censura. O coronel passou os olhos pela prosa, achou aquilo inocente como o chá de tília e assinou de cruz. A coisa ia andando neste remanso. A pouco e pouco, como quem não quer a coisa, eles começaram a meter umas poesias, daquelas em que verdade rima com liberdade, pão com revolução, e assim. E o tropa sempre a assinar de cruz. Até que caíu o Carmo e a Trindade: o coronel foi questionado e apertado pela PIDE por causa da revista dos rapazes. Quando eles se abeiraram, prazenteiros, da mesa do tropa, este atirou-lhes à cara: “Traidores, falsos, malandros, comunistas, comigo não brincam mais. Ficam sabendo que nunca mais deixo passar uma poesia. Nem que seja assinada pelo Salazar”. Ardeu a tenda literária aos académicos que, entretanto, tinham bebido uns litros de café à conta do militar.
Os coronéis da censura em Lisboa também eram desta finura de inteligência. Um dia fizeram uma lista de palavras proibidas que mandaram entregar nas redacções: prostituta, aborto, suicídio, manifestação, liberdade e outras que já não lembro. Eu trabalhava numa agência noticiosa estrangeira, com delegação em Lisboa, cujo chefe colocou logo a lista numa parede, com a mesma rapidez que punha nos pedidos de notícias no estrangeiro que Mário Soares lhe fazia por carta, entregue em mão, num alvoroço que deixava todos a sonhar com o golpe de estado para essa noite. Eu tenho montes de defeitos, mas gosto de ajudar: acrescentei na lista as palavras estudante, repressão, nacionalista africano. Porque, recordo, nas universidades e nas colónias o tempo era de bumba no toutiço.
Nos arraiais da comunicação desejava-se o fim da censura como quem deseja o fim do cancro. Foi um entusiasmo quando os deputados da ala liberal, liderados por Francisco Sá Carneiro, apresentaram um projecto de Lei de Imprensa na Assembleia Nacional, no consulado de Marcelo Caetano. Uma noite, no restaurante Rina, ao Bairro Alto, poiso certo de jornalistas e radialistas, a discussão em torno do assunto foi de tal ordem que, já passava das 23 horas, a patroa nos veio pedir, naquele seu jeito meigo, se podíamos ir conversar para outro lado que ela tinha de levantar-se muito cedo para ir à Ribeira fazer as compras. Levantámos ferro e ancorámos numa leitaria, daquelas que estão abertas toda a noite, e o berreiro continuou. Estava connosco José Carlos Ary dos Santos que nos tinha acompanhado ao jantar. No meio daquele temporal de argumentos, Ary dos Santos levantou-se para ir aos lavabos, ia andando e sempre a voltar-se para traz, o corpanzil imenso, o vozeirão que estremecia tudo, a dizer de sua justiça, quando o tasqueiro o chamou, aflito: “Oh sor Ary, por aí não, aí é para senhoras”. O poeta agarrou a rábula no ar, pôs a mão na anca e declamou: “E eu sou alguma galdéria”? O riso apagou o incêndio.
Como podem calcular, o 25 de Abril foi para nós, em termos de liberdade de expressão, um maná. Quando vi o Manecas das Intentas (Manuel Serra), à janela da censura, deitando para a Rua da Misericórdia pastas e papéis soltos, gritei-lhe cá de baixo:”Pára com isso, burro! Esses papéis são a memória do povo”. Sempre o guardar dessa memória me pareceu obrigatório. E é por nem sempre ter havido esse cuidado que, como num aviso de muito mau prenúncio, registo as palavras proibidas que este governo tem feito saber: estado social, subsídio de férias,subsídio de Natal, feriados com grande significado histórico, empobrecer, cortes desiguais, obediência a Merkel, desobediência civil à troika,escola pública, carnaval, etc. etc.
Gerações sofreram, choraram lágrimas de sangue, encheram as prisões e os exílios, numa luta desigual, para o povo alcançar os direitos que há muitos anos lhe eram devidos. Não podemos consentir no que se está a passar e no que se está a preparar.
por Fernanda Leitão
Quando assentei praça no jornalismo, no século passado, a comunicação social era mantida com trela curta e açaime pela censura. Esta era uma coisa misteriosa, sinistra e caricata, personificada por uns coronéis tarimbeiros sobrados do 28 de Maio de 1926. Eram engraçados, os coronéis da censura. Um grupo de universitários que eu conheci, pontificado por um que veio a ser médico em Moçambique, resolveu editar uma revista, isto em Coimbra, para o que montou um elaborado plano de pega de cernelha à censura. Como o militar que naquela cidade chefiava a censura ia todos os dias tomar a bica à mesma hora, a rapaziada foi-se-lhe chegando,mansa e sonsa, numa conversa mole que encantava o tropa. Quando acharam que o bicho estava pronto para a pega, apareceram-lhe com as provas da revista para a censura. O coronel passou os olhos pela prosa, achou aquilo inocente como o chá de tília e assinou de cruz. A coisa ia andando neste remanso. A pouco e pouco, como quem não quer a coisa, eles começaram a meter umas poesias, daquelas em que verdade rima com liberdade, pão com revolução, e assim. E o tropa sempre a assinar de cruz. Até que caíu o Carmo e a Trindade: o coronel foi questionado e apertado pela PIDE por causa da revista dos rapazes. Quando eles se abeiraram, prazenteiros, da mesa do tropa, este atirou-lhes à cara: “Traidores, falsos, malandros, comunistas, comigo não brincam mais. Ficam sabendo que nunca mais deixo passar uma poesia. Nem que seja assinada pelo Salazar”. Ardeu a tenda literária aos académicos que, entretanto, tinham bebido uns litros de café à conta do militar.
Os coronéis da censura em Lisboa também eram desta finura de inteligência. Um dia fizeram uma lista de palavras proibidas que mandaram entregar nas redacções: prostituta, aborto, suicídio, manifestação, liberdade e outras que já não lembro. Eu trabalhava numa agência noticiosa estrangeira, com delegação em Lisboa, cujo chefe colocou logo a lista numa parede, com a mesma rapidez que punha nos pedidos de notícias no estrangeiro que Mário Soares lhe fazia por carta, entregue em mão, num alvoroço que deixava todos a sonhar com o golpe de estado para essa noite. Eu tenho montes de defeitos, mas gosto de ajudar: acrescentei na lista as palavras estudante, repressão, nacionalista africano. Porque, recordo, nas universidades e nas colónias o tempo era de bumba no toutiço.
Nos arraiais da comunicação desejava-se o fim da censura como quem deseja o fim do cancro. Foi um entusiasmo quando os deputados da ala liberal, liderados por Francisco Sá Carneiro, apresentaram um projecto de Lei de Imprensa na Assembleia Nacional, no consulado de Marcelo Caetano. Uma noite, no restaurante Rina, ao Bairro Alto, poiso certo de jornalistas e radialistas, a discussão em torno do assunto foi de tal ordem que, já passava das 23 horas, a patroa nos veio pedir, naquele seu jeito meigo, se podíamos ir conversar para outro lado que ela tinha de levantar-se muito cedo para ir à Ribeira fazer as compras. Levantámos ferro e ancorámos numa leitaria, daquelas que estão abertas toda a noite, e o berreiro continuou. Estava connosco José Carlos Ary dos Santos que nos tinha acompanhado ao jantar. No meio daquele temporal de argumentos, Ary dos Santos levantou-se para ir aos lavabos, ia andando e sempre a voltar-se para traz, o corpanzil imenso, o vozeirão que estremecia tudo, a dizer de sua justiça, quando o tasqueiro o chamou, aflito: “Oh sor Ary, por aí não, aí é para senhoras”. O poeta agarrou a rábula no ar, pôs a mão na anca e declamou: “E eu sou alguma galdéria”? O riso apagou o incêndio.
Como podem calcular, o 25 de Abril foi para nós, em termos de liberdade de expressão, um maná. Quando vi o Manecas das Intentas (Manuel Serra), à janela da censura, deitando para a Rua da Misericórdia pastas e papéis soltos, gritei-lhe cá de baixo:”Pára com isso, burro! Esses papéis são a memória do povo”. Sempre o guardar dessa memória me pareceu obrigatório. E é por nem sempre ter havido esse cuidado que, como num aviso de muito mau prenúncio, registo as palavras proibidas que este governo tem feito saber: estado social, subsídio de férias,subsídio de Natal, feriados com grande significado histórico, empobrecer, cortes desiguais, obediência a Merkel, desobediência civil à troika,escola pública, carnaval, etc. etc.
Gerações sofreram, choraram lágrimas de sangue, encheram as prisões e os exílios, numa luta desigual, para o povo alcançar os direitos que há muitos anos lhe eram devidos. Não podemos consentir no que se está a passar e no que se está a preparar.
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sábado, abril 21, 2012
Cinquenta anos depois
Carta do Canadá
por Fernanda Leitão
Participei da greve nacional de estudantes universitários, começada em Lisboa em 24 de Março de 1962, lado a lado com largos milhares de outros estudantes. A greve foi consequência da proibição, pelo governo de Salazar, das celebrações do Dia do Estudante. O aparato policial foi impressionante a cercar a Cidade Universitária. Perante o facto, Marcelo Caetano, então Reitor da Universidade Clássica de Lisboa, falou aos milhares de estudantes concentrados frente às Faculdades de Letras e Direito: verificava que, lamentavelmente, de novo o poder executivo pisava o poder legislativo e, visto isso, estavam todos os estudantes convidados a jantar no restaurante Castanheira de Moura, ao Lumiar. Ordeiramente, muitos estudantes dirigiram-se ao restaurante e, quando ali chegaram, foram violentamente espancados pela polícia de choque. Estava aberta a guerra entre academia e regime, que rapidamente alastrou a outras universidades do país. Como seria de esperar, surgiram líderes: Eurico Figueiredo, Jorge Sampaio, Victor Wengorovius, Joaquim Mestre, José Medeiros Ferreira e outros. O Prof. Lindley Cintra, por ser solidário com os estudantes, foi barbamente espancado mas não desistiu. Foi então que se ouviram as vozes de José Afonso, Adriano Correia de Oliveira e Manuel Alegre. Nasceram as baladas de protesto. A repressão foi brutal: foi a hora de (triste) glória do capitão Maltez e de polícias de uma aterradora boçalidade. Dali a poucos meses, muitos daqueles jovens eram mobilizados para a guerra de Angola e colocados nas linhas da frente, depois de umas recrutas que ficaram célebres pelo abuso e brutalidade. Teve então lugar uma emigração a salto, que foi uma verdadeira hemorragia para o país, pois o regime só tinha para oferecer a guerra em África ou a penúria em território europeu.
Um ano antes, quando rebentou a guerra em Angola, um nutrido grupo de membros da Casa dos Estudantes do Império, de que fui a sócia 450, apareceu numa manifestação (de voluntários à força) em apoio a Salazar, e foi espancado com requintes de brutalidade pela GNR a cavalo porque resolveu acompanhar a palavra de ordem orquestrada pelos mentores do regime: Angola é Nossa. Ficámos a perceber que Angola não era nossa, era “deles”. E passámos a chamar à GNR a cavalo a “fracção imprópria”. Nos meses que se seguiram, ondas de estudantes ultramarinos rumaram ao exílio e radicalizaram a sua posição, o que redundou em perda para Portugal e para as colónias.
Julgou-se, ingenuamente, que a revolução de 1974 traria o bom senso elementar de educar as forças policiais, apelando à inteligência e ao facto de serem os seus elementos pessoas do Povo, tornando-os de exemplar civismo e fazendo deles pessoas compreendendo cada situação, de modo a saberem que a mão pesada é para criminosos e terroristas, a exemplo do que se passa em países civilizados. Enganámo-nos.
No consulado de Cavaco Silva, o nunca por demais louvado Dias Loureiro, esse varão impoluto, que era então ministro da Administraçáo Interna, mandou a polícia de choque espancar emigrantes idos de países da Europa e do Canadá, por se terem manifestado em frente do Ministério da Justiça pelo facto de todas as suas poupanças terem sido roubadas pela Caixa Económica Faialense, cujos dirigentes eram barões do PSD.
Volta e meia, em bairros problemáticos, as forças policiais carregam forte e feio sobre pessoas que desesperam de encontrar trabalho, escola, dignidade.
E agora, no Porto, no problemático bairro da Fontinha, de novo foi a brutalidade cega da polícia sobre um grupo que ocupou um imóvel abandonado e o transformou num espaço onde os moradores podiam ler, ver filmes, pintar, fazer teatro, cantar, aprender a ler e escrever, um espaço de generosidade e solidariedade. Um grupo como devia haver às centenas pelo país, sobretudo nesta hora de incerteza e escassez, que congregava as pessoas pelo saber, o conhecimnto, e não pela violência. Depois de baterem à farta, as chamadas forças da ordem partiram portas e janelas, destruíram tudoo que encontraram naquele espaço, numa raiva irracional.
Resumindo: para mal de todos, polícia incluida, a boçalidade continua. Provavelmente porque é uma emanação de quem tutela. E porque quem tutela tenta não sentir medo promovendo a violência.
por Fernanda Leitão
Participei da greve nacional de estudantes universitários, começada em Lisboa em 24 de Março de 1962, lado a lado com largos milhares de outros estudantes. A greve foi consequência da proibição, pelo governo de Salazar, das celebrações do Dia do Estudante. O aparato policial foi impressionante a cercar a Cidade Universitária. Perante o facto, Marcelo Caetano, então Reitor da Universidade Clássica de Lisboa, falou aos milhares de estudantes concentrados frente às Faculdades de Letras e Direito: verificava que, lamentavelmente, de novo o poder executivo pisava o poder legislativo e, visto isso, estavam todos os estudantes convidados a jantar no restaurante Castanheira de Moura, ao Lumiar. Ordeiramente, muitos estudantes dirigiram-se ao restaurante e, quando ali chegaram, foram violentamente espancados pela polícia de choque. Estava aberta a guerra entre academia e regime, que rapidamente alastrou a outras universidades do país. Como seria de esperar, surgiram líderes: Eurico Figueiredo, Jorge Sampaio, Victor Wengorovius, Joaquim Mestre, José Medeiros Ferreira e outros. O Prof. Lindley Cintra, por ser solidário com os estudantes, foi barbamente espancado mas não desistiu. Foi então que se ouviram as vozes de José Afonso, Adriano Correia de Oliveira e Manuel Alegre. Nasceram as baladas de protesto. A repressão foi brutal: foi a hora de (triste) glória do capitão Maltez e de polícias de uma aterradora boçalidade. Dali a poucos meses, muitos daqueles jovens eram mobilizados para a guerra de Angola e colocados nas linhas da frente, depois de umas recrutas que ficaram célebres pelo abuso e brutalidade. Teve então lugar uma emigração a salto, que foi uma verdadeira hemorragia para o país, pois o regime só tinha para oferecer a guerra em África ou a penúria em território europeu.
Um ano antes, quando rebentou a guerra em Angola, um nutrido grupo de membros da Casa dos Estudantes do Império, de que fui a sócia 450, apareceu numa manifestação (de voluntários à força) em apoio a Salazar, e foi espancado com requintes de brutalidade pela GNR a cavalo porque resolveu acompanhar a palavra de ordem orquestrada pelos mentores do regime: Angola é Nossa. Ficámos a perceber que Angola não era nossa, era “deles”. E passámos a chamar à GNR a cavalo a “fracção imprópria”. Nos meses que se seguiram, ondas de estudantes ultramarinos rumaram ao exílio e radicalizaram a sua posição, o que redundou em perda para Portugal e para as colónias.
Julgou-se, ingenuamente, que a revolução de 1974 traria o bom senso elementar de educar as forças policiais, apelando à inteligência e ao facto de serem os seus elementos pessoas do Povo, tornando-os de exemplar civismo e fazendo deles pessoas compreendendo cada situação, de modo a saberem que a mão pesada é para criminosos e terroristas, a exemplo do que se passa em países civilizados. Enganámo-nos.
No consulado de Cavaco Silva, o nunca por demais louvado Dias Loureiro, esse varão impoluto, que era então ministro da Administraçáo Interna, mandou a polícia de choque espancar emigrantes idos de países da Europa e do Canadá, por se terem manifestado em frente do Ministério da Justiça pelo facto de todas as suas poupanças terem sido roubadas pela Caixa Económica Faialense, cujos dirigentes eram barões do PSD.
Volta e meia, em bairros problemáticos, as forças policiais carregam forte e feio sobre pessoas que desesperam de encontrar trabalho, escola, dignidade.
E agora, no Porto, no problemático bairro da Fontinha, de novo foi a brutalidade cega da polícia sobre um grupo que ocupou um imóvel abandonado e o transformou num espaço onde os moradores podiam ler, ver filmes, pintar, fazer teatro, cantar, aprender a ler e escrever, um espaço de generosidade e solidariedade. Um grupo como devia haver às centenas pelo país, sobretudo nesta hora de incerteza e escassez, que congregava as pessoas pelo saber, o conhecimnto, e não pela violência. Depois de baterem à farta, as chamadas forças da ordem partiram portas e janelas, destruíram tudoo que encontraram naquele espaço, numa raiva irracional.
Resumindo: para mal de todos, polícia incluida, a boçalidade continua. Provavelmente porque é uma emanação de quem tutela. E porque quem tutela tenta não sentir medo promovendo a violência.
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sexta-feira, março 30, 2012
Carteira de Senhora
por Leonor Martins de Carvalho
A carteira hoje pôs-me satisfeita. Enfiei a mão, sorrateira, ela baralhou e saiu um estado de alma. Ainda por cima aquele que mais faz parte do nosso quotidiano: a insatisfação. Num genuíno dicionário de português, a palavra satisfação apenas devia aparecer como mero antónimo de insatisfação. Não tem por cá definição própria. Ao latim apenas fomos buscar a raiz da palavra para depressa lhe antepormos o prefixo que a nega.
Quem é que está satisfeito em Portugal? Rigorosamente ninguém. O maior optimista português também reclama contra a fila na repartição…
A insatisfação é intrínseca à portugalidade, está inscrita no nosso ADN. Vê-se mesmo que os únicos satisfeitos que por aí andam não têm este gene. Foram importados por engano. Alguém se esqueceu de verificar se estava preenchido o campo 459 da declaração alfandegária, que exige a insatisfação como permanente estado de alma.
Começa logo de manhã. “Como está, passou bem?” Nunca passou. Nunca. Normalmente vai passando.
Segue-se o tempo. Por mais que se esforce, não há forma de o clima conseguir satisfazer um português. Jamais está a contento.
Depois a vida - ai a vida! – que é sempre madrasta. Da sogra aos filhos, da escola ao trabalho, do hospital às férias, a insatisfação é um parasita constante, sem remédio nem cura. Nunca nada é perfeito. O verdadeiro português nem o que está perto da perfeição aprecia. Se não é perfeito, não satisfaz. Não se contenta com pouco, quer toda a perfeição a que tem direito.
Ao fim do dia, a política. Não conseguem apontar uma única medida que os satisfaça, ou, se conseguem, calam-na para que só as insatisfatórias brilhem no espaço sideral. Esta qualidade do insatisfatório aplica-se especialmente aos intervenientes. Aqui podemos fazer uma ressalva, pois é o único caso em que a insatisfação total se adequa à realidade. Valha-nos uma insatisfação justificada! Desculpa todas as infundadas.
Há 2 espécies de insatisfeitos. Completamente diferentes uma da outra, embora às vezes se encontrem à esquina.
A primeira são os insatisfeitos que gritam e esbracejam em público mas na frente do funcionário são cordeirinhos mansos. Reclamam, queixam-se, murmuram continuamente palavras de ódio entre dentes rangentes, mas afinal baixam os braços, aceitando resignados, e como cruz, a raiz, caule, flor e frutos da insatisfação.
A segunda espécie - nem vão acreditar - deu origem aos Descobrimentos. Afinal sempre pode ser uma virtude, a insatisfação… Estes insatisfeitos são os que não gostam desse estado de alma e, por isso, lutam em busca da resolução do busílis da questão. Sofrem de inquietude aguda e não ficam satisfeitos enquanto não se livram do que lhes rói a alma. São os que não desistem, actuam, escrevem no livro amarelo, emigram, lutam, vão àquela manifestação por aquilo em que acreditam mesmo que sejam só vinte.
Afinal, não fora os insatisfeitos não haveria Portugal, ou não fossem D. Afonso Henriques, D. João I, o Infante D. Henrique, os conjurados, D. João IV, uns perfeitos insatisfeitos…
Na essência, somos produto das duas espécies, dependendo das circunstâncias, e neste momento Portugal precisa urgentemente da segunda. A brava.
A carteira hoje pôs-me satisfeita. Enfiei a mão, sorrateira, ela baralhou e saiu um estado de alma. Ainda por cima aquele que mais faz parte do nosso quotidiano: a insatisfação. Num genuíno dicionário de português, a palavra satisfação apenas devia aparecer como mero antónimo de insatisfação. Não tem por cá definição própria. Ao latim apenas fomos buscar a raiz da palavra para depressa lhe antepormos o prefixo que a nega.
Quem é que está satisfeito em Portugal? Rigorosamente ninguém. O maior optimista português também reclama contra a fila na repartição…
A insatisfação é intrínseca à portugalidade, está inscrita no nosso ADN. Vê-se mesmo que os únicos satisfeitos que por aí andam não têm este gene. Foram importados por engano. Alguém se esqueceu de verificar se estava preenchido o campo 459 da declaração alfandegária, que exige a insatisfação como permanente estado de alma.
Começa logo de manhã. “Como está, passou bem?” Nunca passou. Nunca. Normalmente vai passando.
Segue-se o tempo. Por mais que se esforce, não há forma de o clima conseguir satisfazer um português. Jamais está a contento.
Depois a vida - ai a vida! – que é sempre madrasta. Da sogra aos filhos, da escola ao trabalho, do hospital às férias, a insatisfação é um parasita constante, sem remédio nem cura. Nunca nada é perfeito. O verdadeiro português nem o que está perto da perfeição aprecia. Se não é perfeito, não satisfaz. Não se contenta com pouco, quer toda a perfeição a que tem direito.
Ao fim do dia, a política. Não conseguem apontar uma única medida que os satisfaça, ou, se conseguem, calam-na para que só as insatisfatórias brilhem no espaço sideral. Esta qualidade do insatisfatório aplica-se especialmente aos intervenientes. Aqui podemos fazer uma ressalva, pois é o único caso em que a insatisfação total se adequa à realidade. Valha-nos uma insatisfação justificada! Desculpa todas as infundadas.
Há 2 espécies de insatisfeitos. Completamente diferentes uma da outra, embora às vezes se encontrem à esquina.
A primeira são os insatisfeitos que gritam e esbracejam em público mas na frente do funcionário são cordeirinhos mansos. Reclamam, queixam-se, murmuram continuamente palavras de ódio entre dentes rangentes, mas afinal baixam os braços, aceitando resignados, e como cruz, a raiz, caule, flor e frutos da insatisfação.
A segunda espécie - nem vão acreditar - deu origem aos Descobrimentos. Afinal sempre pode ser uma virtude, a insatisfação… Estes insatisfeitos são os que não gostam desse estado de alma e, por isso, lutam em busca da resolução do busílis da questão. Sofrem de inquietude aguda e não ficam satisfeitos enquanto não se livram do que lhes rói a alma. São os que não desistem, actuam, escrevem no livro amarelo, emigram, lutam, vão àquela manifestação por aquilo em que acreditam mesmo que sejam só vinte.
Afinal, não fora os insatisfeitos não haveria Portugal, ou não fossem D. Afonso Henriques, D. João I, o Infante D. Henrique, os conjurados, D. João IV, uns perfeitos insatisfeitos…
Na essência, somos produto das duas espécies, dependendo das circunstâncias, e neste momento Portugal precisa urgentemente da segunda. A brava.
Fonte: Eternas Saudades do Futuro
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quinta-feira, março 29, 2012
sexta-feira, março 09, 2012
A sobremesa americana
CARTA DO CANADÁ
por Fernanda Leitão
O prémio Nobel, depois de lhe terem aposto as insígnias doutorais de três universidades, desabafou, entre naif e apardalado, que nunca tinha tido tantas coisas penduradas no pescoço ao mesmo tempo. Ninguém o avisou que Portugal é a pátria do oito ou oitenta. Depois, no silêncio do seu quarto de hotel, Paul Krugman escreveu para o New York Times uma prosa datada de Lisboa.
Prosa desencantada que começa “por aqui as coisas estão terríveis”, estende a lista do desemprego alarmante, da economia que não cresce, da classe média esmagada e vestindo o estatuto de novos pobres, da recessão garantida, da dívida que não é garantido poder ser paga. E acaba perguntando:”Porque é que a Europa se tornou o doente da economia mundial?”. Para, de novo, elaborar uma lista de razões e de comparações, acabando por denunciar a “irresponsabilidade fiscal” e o excesso de austeridade despótica da Alemanha. Que, no seu parecer, vai provocar situações como a da Grécia nos países do sul da Europa. E não só, já que se mostra sombrio em relação à Irlanda, Bélgica e Holanda.
E rematou: “Para o resto do mundo ter a Europa no caminho certo faz toda a diferença, porque as histórias acerca da Europa estão a ser usadas para impor políticas cruéis ou destruidoras, ou ambas as coisas. Quando voltar a ouvir pessoas invocando o exemplo europeu com o fito de exigir a destruição da segurança social ou os cortes brutais numa economia profundamente deprimida, é preciso que saiba: essas pessoas não sabem do que estão a falar”.
Os meios da comunicação social portugueses referiram repetidamente os almoços que Krugman teve com o primeiro ministro e o ministro das Finanças, como quem tem a certeza de não haver almoços grátis em parte nenhuma. Não ponho de parte que o governo tenha apreciado esses almoços com uma lente de aumentar. Mas estou certa que não apreciou mesmo nada esta sobremesa americana deixada à solta na imprensa internacional, sobretudo neste período de azia provocada pelo petisco de Vancouver. Krugman, esse, americano e pachola, deve ter dito o que dizem os americanos pacholas quando lhes oferecem almoços: it was lovely. Mesmo não tendo gostado por aí além... Marketing oblige.
O prémio Nobel, depois de lhe terem aposto as insígnias doutorais de três universidades, desabafou, entre naif e apardalado, que nunca tinha tido tantas coisas penduradas no pescoço ao mesmo tempo. Ninguém o avisou que Portugal é a pátria do oito ou oitenta. Depois, no silêncio do seu quarto de hotel, Paul Krugman escreveu para o New York Times uma prosa datada de Lisboa.
Prosa desencantada que começa “por aqui as coisas estão terríveis”, estende a lista do desemprego alarmante, da economia que não cresce, da classe média esmagada e vestindo o estatuto de novos pobres, da recessão garantida, da dívida que não é garantido poder ser paga. E acaba perguntando:”Porque é que a Europa se tornou o doente da economia mundial?”. Para, de novo, elaborar uma lista de razões e de comparações, acabando por denunciar a “irresponsabilidade fiscal” e o excesso de austeridade despótica da Alemanha. Que, no seu parecer, vai provocar situações como a da Grécia nos países do sul da Europa. E não só, já que se mostra sombrio em relação à Irlanda, Bélgica e Holanda.
E rematou: “Para o resto do mundo ter a Europa no caminho certo faz toda a diferença, porque as histórias acerca da Europa estão a ser usadas para impor políticas cruéis ou destruidoras, ou ambas as coisas. Quando voltar a ouvir pessoas invocando o exemplo europeu com o fito de exigir a destruição da segurança social ou os cortes brutais numa economia profundamente deprimida, é preciso que saiba: essas pessoas não sabem do que estão a falar”.
Os meios da comunicação social portugueses referiram repetidamente os almoços que Krugman teve com o primeiro ministro e o ministro das Finanças, como quem tem a certeza de não haver almoços grátis em parte nenhuma. Não ponho de parte que o governo tenha apreciado esses almoços com uma lente de aumentar. Mas estou certa que não apreciou mesmo nada esta sobremesa americana deixada à solta na imprensa internacional, sobretudo neste período de azia provocada pelo petisco de Vancouver. Krugman, esse, americano e pachola, deve ter dito o que dizem os americanos pacholas quando lhes oferecem almoços: it was lovely. Mesmo não tendo gostado por aí além... Marketing oblige.
quinta-feira, março 08, 2012
Mário Saraiva - A traição de Felipe II
In Mário Saraiva, Apontamentos - História, Literatura, Política, Lisboa, Universitária Editora, 1996, pp. 181-186.
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Mário Saraiva - Para a História Sebástica
Eis três páginas notáveis da historiografia portuguesa, que são um verdadeiro clarão iluminando a História do rei D. Sebastião, de Portugal, de Marrocos e de Espanha.
In Mário Saraiva, "Para a História Sebástica", Correio da Manhã, 25 de Abril de 1993; aqui reproduzido a partir de Mário Saraiva, Impressões e Memória, Lisboa, Universitária Editora, 1998, pp. 47-49.
O documento aqui referido por Mário Saraiva foi publicado em
O Arquivo da Fundación Casa Medina Sidonia é um dos mais ricos Arquivos Históricos da Peninsula Ibérica e, depois desta chamada de atenção de Mário Saraiva, tornou-se verdadeiramente incontornável no que concerne aos Estudos Sebásticos.
In Mário Saraiva, "Para a História Sebástica", Correio da Manhã, 25 de Abril de 1993; aqui reproduzido a partir de Mário Saraiva, Impressões e Memória, Lisboa, Universitária Editora, 1998, pp. 47-49.
O documento aqui referido por Mário Saraiva foi publicado em
- Álvarez de Toledo, Luísa Isabel. Alcazar Quivir. Madrid, Fundación Universidad Complutense – Casa de Medina Sidonia, 1993.
O Arquivo da Fundación Casa Medina Sidonia é um dos mais ricos Arquivos Históricos da Peninsula Ibérica e, depois desta chamada de atenção de Mário Saraiva, tornou-se verdadeiramente incontornável no que concerne aos Estudos Sebásticos.
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quarta-feira, fevereiro 29, 2012
Ou vai ou racha
CARTA DO CANADÁ
por Fernanda Leitão
Há dias podia ler-se num editorial do New York Times, todo ele dedicado à situação na União Europeia:
"Porque é que os líderes da Europa se empenham em negar a realidade? A chanceler Angela Merkel, da Alemanha, e o presidente Nicolas Sarcozy, da França, mostram-se incapazes de admitir que vão por caminho errado. Estão deslumbrados com a sedutora mas ilógica noção de que todos os países devem copiar o “modelo exportador” da Alemanha, sem décadas de investimento público e taxas artificialmente baixas, cruciais para o sucesso germânico? A Sra Merkel também parece determinada a inclinar-se perante os preconceitos dos eleitores alemães, os quais acreditam que o sofrimento é a única maneira de a Grécia, e os outros países da Europa do Sul, entrarem no bom caminho".
Que esses dois líderes pensem de forma tão redutora e pobre, não surpreende quem tem boa memória ou o salutar hábito de ler o que a História ensina. Há países onde as televisões se preocupam em não deixar apagar-se a memória do sofrimento que a Alemanha, por má liderança, e a França, por cobardia das elites, inflingiram a milhões de pessoas. O Canadá é um desses países. Devo acrescentar que a cada passo oiço canadianos dizer a propósito da situação na UE: “A Alemanha, outra vez!”. E anglo-saxónicos puros e duros desabafando: “A França é sempre a mesma doida”. Nestas expressões há receio, há desagrado, há um escondido grito de alarme. Dirão: é a mania da superioridade dos ingleses. Será, mas têm boas razões para isso: se não fossem eles, patriotas, a dar o primeiro grande passo da resistência, a Europa teria sido esmagada e abastardada por um punhado de facínoras.
O sonho da Comunidade Europeia foi, a partir das ruínas, bater-se pelos Direitos Humanos pelos quais várias gerações ansiaram e pelos quais lutaram. Foi um ideal de solidariedade, de partilha, de bem comum, de paz. Mas afastados que foram os fundadores, por morte ou idade avançada, a UE foi, pouco a pouco, caindo na mediocridade, no mercantilismo, na ausência de valores morais e espirituais. Abriu a porta larga a todos os oportunistas.
É um dado adquirido que austeridade sem desenvolvimento económico é um suicídio, como recentemente disse o primeiro ministro de Espanha. E austeridade cega, de cortar a eito, custe o que custar, é a destruição total de um país e de um povo. Então, se já há vários dirigentes europeus a dizê-lo, vai sendo tempo de, em conjunto, dizerem em Bruxelas o que deve ser dito, ao arrepio das ameaças de Merkel e Sarcozy ou das tiradas de Barroso que, coitado, segura pelas pontas o emprego bem pago.
Em Portugal, não conseguiremos sair do beco armadilhado em que nos meteram, como disse Krugman, o prémio Nobel da Economia, com estes dirigentes tão ignorantes da História e da Vida, tão destituídos de patriotismo que deitam a memória da Restauração para o lixo, tão desnorteados que pensam criar riqueza cortando um dia de folguedo ao povo, tão servis perante o estrangeiro que deram à troika uma importância que ela não tem e se rebolam de vaidade quando essa troika os elogia por excesso de zelo.
É hora de mudar. Ou os dirigentes actuais arrancam a pele e vestem outra, bem portuguesa, ou os portugueses de lei mudam de dirigentes. A Pátria vale bem essa ousadia.
por Fernanda Leitão
Há dias podia ler-se num editorial do New York Times, todo ele dedicado à situação na União Europeia:
"Porque é que os líderes da Europa se empenham em negar a realidade? A chanceler Angela Merkel, da Alemanha, e o presidente Nicolas Sarcozy, da França, mostram-se incapazes de admitir que vão por caminho errado. Estão deslumbrados com a sedutora mas ilógica noção de que todos os países devem copiar o “modelo exportador” da Alemanha, sem décadas de investimento público e taxas artificialmente baixas, cruciais para o sucesso germânico? A Sra Merkel também parece determinada a inclinar-se perante os preconceitos dos eleitores alemães, os quais acreditam que o sofrimento é a única maneira de a Grécia, e os outros países da Europa do Sul, entrarem no bom caminho".
Que esses dois líderes pensem de forma tão redutora e pobre, não surpreende quem tem boa memória ou o salutar hábito de ler o que a História ensina. Há países onde as televisões se preocupam em não deixar apagar-se a memória do sofrimento que a Alemanha, por má liderança, e a França, por cobardia das elites, inflingiram a milhões de pessoas. O Canadá é um desses países. Devo acrescentar que a cada passo oiço canadianos dizer a propósito da situação na UE: “A Alemanha, outra vez!”. E anglo-saxónicos puros e duros desabafando: “A França é sempre a mesma doida”. Nestas expressões há receio, há desagrado, há um escondido grito de alarme. Dirão: é a mania da superioridade dos ingleses. Será, mas têm boas razões para isso: se não fossem eles, patriotas, a dar o primeiro grande passo da resistência, a Europa teria sido esmagada e abastardada por um punhado de facínoras.
O sonho da Comunidade Europeia foi, a partir das ruínas, bater-se pelos Direitos Humanos pelos quais várias gerações ansiaram e pelos quais lutaram. Foi um ideal de solidariedade, de partilha, de bem comum, de paz. Mas afastados que foram os fundadores, por morte ou idade avançada, a UE foi, pouco a pouco, caindo na mediocridade, no mercantilismo, na ausência de valores morais e espirituais. Abriu a porta larga a todos os oportunistas.
É um dado adquirido que austeridade sem desenvolvimento económico é um suicídio, como recentemente disse o primeiro ministro de Espanha. E austeridade cega, de cortar a eito, custe o que custar, é a destruição total de um país e de um povo. Então, se já há vários dirigentes europeus a dizê-lo, vai sendo tempo de, em conjunto, dizerem em Bruxelas o que deve ser dito, ao arrepio das ameaças de Merkel e Sarcozy ou das tiradas de Barroso que, coitado, segura pelas pontas o emprego bem pago.
Em Portugal, não conseguiremos sair do beco armadilhado em que nos meteram, como disse Krugman, o prémio Nobel da Economia, com estes dirigentes tão ignorantes da História e da Vida, tão destituídos de patriotismo que deitam a memória da Restauração para o lixo, tão desnorteados que pensam criar riqueza cortando um dia de folguedo ao povo, tão servis perante o estrangeiro que deram à troika uma importância que ela não tem e se rebolam de vaidade quando essa troika os elogia por excesso de zelo.
É hora de mudar. Ou os dirigentes actuais arrancam a pele e vestem outra, bem portuguesa, ou os portugueses de lei mudam de dirigentes. A Pátria vale bem essa ousadia.
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quarta-feira, fevereiro 15, 2012
segunda-feira, fevereiro 13, 2012
Lá fora e cá dentro
CARTA DO CANADÁ
por Fernanda Leitão
Ensina-me a experiência que é prudente não acreditar em pessoas que, para enriquecerem o curriculum, proclamam repetidamente que são “africanistas”. Na prática são colonialistas de mentalidade e actos. Ficou-lhes agarrada à pele, na sua passagem pelas colónias, uma atracção encantada pelo capataz de roça. Em geral, de tudo fazem (ou julgam fazer) uma roça.
O famoso vídeo que deu a volta ao mundo, aquele minuto de conversa sussurrada entre o Ministro das Finanças de Portugal e o seu homólogo da Alemanha, cuja linguagem corporal só por si dizia tudo de servilismo e diplomacia de cócoras, vem confirmar as suspeitas que se agigantam seis meses depois da entronização do actual governo que,dizia ele, vinha para salvar os portugueses das garras da maldade da exploração e da mentira. Escusa o cómico de serviço ao regime, seja o governo qual for, bolsar que é o contrário disto, nos programas que os contribuintes andam a pagar, porque ninguém lhe dá crédito, também a ele. De resto, a confirmação da bajulice vem do chefe do governo, e seus acólitos,quando trombeteia que “nós vamos além da troika”. É o que se chama querer mostrar serviço, “custe o que custar”, e está a custar fome, miséria, privação e desespero a largos milhares de portugueses, que vêem a Pátria a sucumbir às mãos de agiotas. Já pela Europa fora peritos sensatos sublinham que a receita autoritária da chanceleira Merkel não cura países aflitos, antes os mata, mas o primeiro ministro fabricado na jota mantém-se irredutível na sua fidelidade canina. Nem a opinião contrária do FMI o demove na sua obediência babada àquela Adolfa.
Tudo visto e revisto, fácil é concluir que este governo trata Portugal como se fosse a roça dos alemães. Cá dentro, é capataz. Lá fora, é mainato. E sofremos nós uma descolonização apressada, mal feita, até criminosa, para o país ter a subida honra de fazer parte da União Europeia. Quero crer que muitos europeistas eram idealistas e estavam de boa fé, mas foram ingénuos e descuidados no escrutinar regras e tratados linha por linha, palavra por palavra. Nem eles conheciam bem o terreno que pisavam, nem o deram a conhecer ao povo, já que não houve esclarecimento em profundidade e referendo logo de seguida. Um povo inteiro atrás de um punhado de enganados. Foi-se despejando dinheiro por cima do país, o crédito era fácil, os portugueses, como sempre,caíram na vigarice do vigésimo premiado. Porque, afinal, se chegou a este completo desconchavo: na União Europeia quem põe e dispõe é a Alemanha. O resto é cantiga para boi dormir.
Esta situação, já praticamente irreversível por estarmos a tratar com pessoas que devem tudo à ignorância arrogante, vai acabar mal. O que está a acontecer à Grécia, traída por uma clique medíocre de políticos, acaba por acontecer a todos os países que estão na fila para o cadafalso financeiro. Acreditar que não será assim, é como acreditar que o cancro só mata os outros. Não faz sentido gritar “nós não somos a Grécia”. Até ao momento, a única grande diferença é que os gregos batem o pé e os portugueses engolem em seco. O que faz sentido é aprender a lição sofrida pela Grécia e dizer à União Europeia que basta! É juntar-se aos países que já o dizem. A união dos descontentes pode bem salvar a Europa.
por Fernanda Leitão
Ensina-me a experiência que é prudente não acreditar em pessoas que, para enriquecerem o curriculum, proclamam repetidamente que são “africanistas”. Na prática são colonialistas de mentalidade e actos. Ficou-lhes agarrada à pele, na sua passagem pelas colónias, uma atracção encantada pelo capataz de roça. Em geral, de tudo fazem (ou julgam fazer) uma roça.
O famoso vídeo que deu a volta ao mundo, aquele minuto de conversa sussurrada entre o Ministro das Finanças de Portugal e o seu homólogo da Alemanha, cuja linguagem corporal só por si dizia tudo de servilismo e diplomacia de cócoras, vem confirmar as suspeitas que se agigantam seis meses depois da entronização do actual governo que,dizia ele, vinha para salvar os portugueses das garras da maldade da exploração e da mentira. Escusa o cómico de serviço ao regime, seja o governo qual for, bolsar que é o contrário disto, nos programas que os contribuintes andam a pagar, porque ninguém lhe dá crédito, também a ele. De resto, a confirmação da bajulice vem do chefe do governo, e seus acólitos,quando trombeteia que “nós vamos além da troika”. É o que se chama querer mostrar serviço, “custe o que custar”, e está a custar fome, miséria, privação e desespero a largos milhares de portugueses, que vêem a Pátria a sucumbir às mãos de agiotas. Já pela Europa fora peritos sensatos sublinham que a receita autoritária da chanceleira Merkel não cura países aflitos, antes os mata, mas o primeiro ministro fabricado na jota mantém-se irredutível na sua fidelidade canina. Nem a opinião contrária do FMI o demove na sua obediência babada àquela Adolfa.
Tudo visto e revisto, fácil é concluir que este governo trata Portugal como se fosse a roça dos alemães. Cá dentro, é capataz. Lá fora, é mainato. E sofremos nós uma descolonização apressada, mal feita, até criminosa, para o país ter a subida honra de fazer parte da União Europeia. Quero crer que muitos europeistas eram idealistas e estavam de boa fé, mas foram ingénuos e descuidados no escrutinar regras e tratados linha por linha, palavra por palavra. Nem eles conheciam bem o terreno que pisavam, nem o deram a conhecer ao povo, já que não houve esclarecimento em profundidade e referendo logo de seguida. Um povo inteiro atrás de um punhado de enganados. Foi-se despejando dinheiro por cima do país, o crédito era fácil, os portugueses, como sempre,caíram na vigarice do vigésimo premiado. Porque, afinal, se chegou a este completo desconchavo: na União Europeia quem põe e dispõe é a Alemanha. O resto é cantiga para boi dormir.
Esta situação, já praticamente irreversível por estarmos a tratar com pessoas que devem tudo à ignorância arrogante, vai acabar mal. O que está a acontecer à Grécia, traída por uma clique medíocre de políticos, acaba por acontecer a todos os países que estão na fila para o cadafalso financeiro. Acreditar que não será assim, é como acreditar que o cancro só mata os outros. Não faz sentido gritar “nós não somos a Grécia”. Até ao momento, a única grande diferença é que os gregos batem o pé e os portugueses engolem em seco. O que faz sentido é aprender a lição sofrida pela Grécia e dizer à União Europeia que basta! É juntar-se aos países que já o dizem. A união dos descontentes pode bem salvar a Europa.
sexta-feira, fevereiro 03, 2012
Eu não sou Monárquico!
Na babilónia de ideias e de conceitos do actual debate “República versus Monarquia”, eu quero afirmar aqui, sem qualquer subterfúgio, que não sou Monárquico!
A Monarquia terminou em 1820 e não a quero de volta. E não quero também de volta a Monarquia que lhe sucedeu, a chamada “Monarquia Constitucional”, derrubada em 1910. Vivo bem, e creio que os meus concidadãos também vivem bem, sem a verídica Monarquia do século XVIII e sem a Monarquia com alcunha do século XIX.
Sou pela República! Sou republicano! Sou aliás visceral e radicalmente republicano!
A República ( Res publica ou Coisa pública) tem, entre nós, uma longa e nobre tradição, bem viva antes do século XVIII. É com essa Tradição que me identifico.
Eis o que nos diz Duarte Nunes de Leão na “Crónica del-Rei D. Fernando”: “em cortes que para isso ajuntou fez algumas leis muito úteis à república, e naqueles tempos muito necessárias.”
Na orientação que traçou para o seu reinado, escreveu o rei D. Sebastião numa das suas “Máximas”: “Gavar os homens, e cavaleiros que tiverem bons procedimentos, diante de gente, e os que tiverem préstimo para a República e mostrar aborrecimento às coisas a ela prejudiciais”.
Depois da Restauração de 1640, exarou o Doutor Vaz de Gouveia na “Justa Aclamação”: “o poder dos reis está originariamente nos povos e nas repúblicas, que delas o recebem por forma imediata.”
Não julgo ser necessário alongar aqui as citações comprovativas da República portuguesa ao longo dos séculos, mas cumpre lembrar que foi quando as Cortes deixaram de reunir, no século XVIII, que começou a haver cada vez mais Monarquia em Portugal.
Depois, a temática política do século XIX tratou de inventar o antagonismo, colocando, de um lado, os chamados “monárquicos” e, do outro, os chamados “republicanos”. Os primeiros diziam defender o Rei, os segundos defender a Res publica. Estava instalado um pernicioso divórcio. Em abono da verdade, os republicanos tinham motivo para classificar os seus adversários como monárquicos. Não eram outra coisa ou, melhor, eram apenas isso. Pouco lhes importava o bem da Res publica, da Coisa pública. Quando o republicanismo se tornou consciente e organizado, os seus adversários, se bem que adoptando a alcunha de constitucional, aceitaram de bom grado a qualificação de monárquicos. Diziam defender o Rei e era, com efeito, à sombra do poder do monarca, à sombra do suposto “poder de um só”, que eles usufruíam das benesses do poder do Estado. E foi só quando o Rei D. Carlos se opôs à rapina que a coisa deu para o torto. Por isso o mataram e, depois de derrubada a Instituição Real, só às atenções mais distraídas causou escândalo a adesivagem em massa que os ditos monárquicos fizeram à novel “República”. Tinha sido feita uma mudança de tabuleta na mesma droga e não foi difícil abrigarem-se nela. Estamos nisto vai para mais de um século.
Hoje, o que me separa de um “soi-disant” republicano, mas de um republicano que queira mesmo o bem da República, é fundamentalmente isto: ele quer para a República um presidente eleito; eu quero que a República remate pela chefatura dinástica de um Rei. Ele defende a Presidência da República; eu defendo a Instituição Real na chefia do Estado.
Eu não sou Monárquico; sou Realista!
José Manuel Quintas
A Monarquia terminou em 1820 e não a quero de volta. E não quero também de volta a Monarquia que lhe sucedeu, a chamada “Monarquia Constitucional”, derrubada em 1910. Vivo bem, e creio que os meus concidadãos também vivem bem, sem a verídica Monarquia do século XVIII e sem a Monarquia com alcunha do século XIX.
Sou pela República! Sou republicano! Sou aliás visceral e radicalmente republicano!
A República ( Res publica ou Coisa pública) tem, entre nós, uma longa e nobre tradição, bem viva antes do século XVIII. É com essa Tradição que me identifico.
Eis o que nos diz Duarte Nunes de Leão na “Crónica del-Rei D. Fernando”: “em cortes que para isso ajuntou fez algumas leis muito úteis à república, e naqueles tempos muito necessárias.”
Na orientação que traçou para o seu reinado, escreveu o rei D. Sebastião numa das suas “Máximas”: “Gavar os homens, e cavaleiros que tiverem bons procedimentos, diante de gente, e os que tiverem préstimo para a República e mostrar aborrecimento às coisas a ela prejudiciais”.
Depois da Restauração de 1640, exarou o Doutor Vaz de Gouveia na “Justa Aclamação”: “o poder dos reis está originariamente nos povos e nas repúblicas, que delas o recebem por forma imediata.”
Não julgo ser necessário alongar aqui as citações comprovativas da República portuguesa ao longo dos séculos, mas cumpre lembrar que foi quando as Cortes deixaram de reunir, no século XVIII, que começou a haver cada vez mais Monarquia em Portugal.
Depois, a temática política do século XIX tratou de inventar o antagonismo, colocando, de um lado, os chamados “monárquicos” e, do outro, os chamados “republicanos”. Os primeiros diziam defender o Rei, os segundos defender a Res publica. Estava instalado um pernicioso divórcio. Em abono da verdade, os republicanos tinham motivo para classificar os seus adversários como monárquicos. Não eram outra coisa ou, melhor, eram apenas isso. Pouco lhes importava o bem da Res publica, da Coisa pública. Quando o republicanismo se tornou consciente e organizado, os seus adversários, se bem que adoptando a alcunha de constitucional, aceitaram de bom grado a qualificação de monárquicos. Diziam defender o Rei e era, com efeito, à sombra do poder do monarca, à sombra do suposto “poder de um só”, que eles usufruíam das benesses do poder do Estado. E foi só quando o Rei D. Carlos se opôs à rapina que a coisa deu para o torto. Por isso o mataram e, depois de derrubada a Instituição Real, só às atenções mais distraídas causou escândalo a adesivagem em massa que os ditos monárquicos fizeram à novel “República”. Tinha sido feita uma mudança de tabuleta na mesma droga e não foi difícil abrigarem-se nela. Estamos nisto vai para mais de um século.
Hoje, o que me separa de um “soi-disant” republicano, mas de um republicano que queira mesmo o bem da República, é fundamentalmente isto: ele quer para a República um presidente eleito; eu quero que a República remate pela chefatura dinástica de um Rei. Ele defende a Presidência da República; eu defendo a Instituição Real na chefia do Estado.
Eu não sou Monárquico; sou Realista!
José Manuel Quintas
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quarta-feira, fevereiro 01, 2012
A sabedoria do Povo
CARTA
DO CANADÁ
por Fernanda Leitão
Um insulto de artrite num joelho, obrigando a imobilidade, saco de gelo e anti-inflamatórios, não é pera doce mas tem a vantagem de vermos televisão sem remorsos de roubar esse tempo a tarefas ditas úteis, sobretudo se podemos dispor de mais de cem canais em várias línguas, isto é, se entre o lixo podemos escolher o que é bom. Se o leitor está a pensar que considero a televisão um artigo utilitário e nada mais do que isso, acertou.
Mastiguei, pedacinho a pedacinho, um longo documentário sobre o regresso dos gregos à agricultura. Barcos cheios, famílias inteiras deixando Atenas e outras cidades para regressarem aos abandonados campos das suas ilhas. Também eles foram vítimas de políticos de vistas curtas e vasto engodo pelos dinheiros da União Europeia, sem a cultura histórica que lhes daria a prudência de não porem os seus países a jeito do lobo alemão. Soube-me bem ver a determinação e a coragem com que milhares de gregos pegam nos tractores e nas enxadas, amanham hortas e pomares, deitam sementes à terra, fazem colmeias, instalam rebanhos e, ao mesmo tempo, não esquecem o turismo a vir. Não acreditam nos governantes, mas acreditam em si mesmos, que é o mais importante. Se não pagarem a dívida, não se sentirão inferiores como pretende a Alemanha, essa que tem para com a Grécia uma dívida de centenas de milhões, a que foi condenada pelo que roubou e pelos danos causados à nação helénica durante a II Guerra Mundial, e se permite o abuso de não pagar. Ao contrário da Itália, também condenada por causa das malfeitorias das tropas de Mussolini: pagou tudo aos gregos. Enfim, gostei de ver como os gregos levantam a cabeça, não amocham e estão ali para o que der e vier. Povo antigo, povo sábio.
Espero que estes documentários passem nas televisões portuguesas para nos sentirmos menos sós. Porque também nós havemos de chegar ao momento de levantar a cabeça e não amochar diante dos criados de quarto dos figurões estrangeiros que enchem os bolsos com o nosso empobrecimento. Em Portugal, como em todos os países, há élites. Que podem ser positivas ou negativas. Por agora, estamos na negativa. Mas a história ensina-nos que,ao contrário das élites negativas, o povo português nunca traíu a Pátria. E há sempre uma élite positiva que se lhe junta na 23ª hora. Somos um povo velho e sábio.
Calhei de encontrar um programa português, o Reencontro, filmado em Angola, de que foi pivot Fátima Campos Ferreira. Creio que chamam àquilo “diplomacia económica”, mas a mim pareceu-me diplomacia de cócoras no exclusivo interesse de certos governantes que se consideram africanistas porque em garotos passaram meia dúzia de anos nas antigas colónias. São a martelo como o whiskey de Sacavém. Coisa feia. Mudei logo de canal. Gostava de ter ali a meu lado, naquele momento, patrícios meus, negros e mulatos, velhos amigos, para nos rirmos destes que, talvez para serem dignos herdeiros de papá, são todos da kuribeka. Precisam de muleta. E havíamos de sorrir recordando velhas histórias das moças do colégio de Sá da Bandeira, naquele tempo dirigido pela Madre Paiva Couceiro, filha do inesquecível capitão das guerras de África e das incursões monárquicas. Contavam elas que, quando sabia que alguma loja maçónica estava a ser construída ou instalada, a Madre ia na noite escura mais as moças pôr medalhas bentas na obra.
E diziam, contentes, que aquelas kuribekas davam em nada.
por Fernanda Leitão
Um insulto de artrite num joelho, obrigando a imobilidade, saco de gelo e anti-inflamatórios, não é pera doce mas tem a vantagem de vermos televisão sem remorsos de roubar esse tempo a tarefas ditas úteis, sobretudo se podemos dispor de mais de cem canais em várias línguas, isto é, se entre o lixo podemos escolher o que é bom. Se o leitor está a pensar que considero a televisão um artigo utilitário e nada mais do que isso, acertou.
Mastiguei, pedacinho a pedacinho, um longo documentário sobre o regresso dos gregos à agricultura. Barcos cheios, famílias inteiras deixando Atenas e outras cidades para regressarem aos abandonados campos das suas ilhas. Também eles foram vítimas de políticos de vistas curtas e vasto engodo pelos dinheiros da União Europeia, sem a cultura histórica que lhes daria a prudência de não porem os seus países a jeito do lobo alemão. Soube-me bem ver a determinação e a coragem com que milhares de gregos pegam nos tractores e nas enxadas, amanham hortas e pomares, deitam sementes à terra, fazem colmeias, instalam rebanhos e, ao mesmo tempo, não esquecem o turismo a vir. Não acreditam nos governantes, mas acreditam em si mesmos, que é o mais importante. Se não pagarem a dívida, não se sentirão inferiores como pretende a Alemanha, essa que tem para com a Grécia uma dívida de centenas de milhões, a que foi condenada pelo que roubou e pelos danos causados à nação helénica durante a II Guerra Mundial, e se permite o abuso de não pagar. Ao contrário da Itália, também condenada por causa das malfeitorias das tropas de Mussolini: pagou tudo aos gregos. Enfim, gostei de ver como os gregos levantam a cabeça, não amocham e estão ali para o que der e vier. Povo antigo, povo sábio.
Espero que estes documentários passem nas televisões portuguesas para nos sentirmos menos sós. Porque também nós havemos de chegar ao momento de levantar a cabeça e não amochar diante dos criados de quarto dos figurões estrangeiros que enchem os bolsos com o nosso empobrecimento. Em Portugal, como em todos os países, há élites. Que podem ser positivas ou negativas. Por agora, estamos na negativa. Mas a história ensina-nos que,ao contrário das élites negativas, o povo português nunca traíu a Pátria. E há sempre uma élite positiva que se lhe junta na 23ª hora. Somos um povo velho e sábio.
Calhei de encontrar um programa português, o Reencontro, filmado em Angola, de que foi pivot Fátima Campos Ferreira. Creio que chamam àquilo “diplomacia económica”, mas a mim pareceu-me diplomacia de cócoras no exclusivo interesse de certos governantes que se consideram africanistas porque em garotos passaram meia dúzia de anos nas antigas colónias. São a martelo como o whiskey de Sacavém. Coisa feia. Mudei logo de canal. Gostava de ter ali a meu lado, naquele momento, patrícios meus, negros e mulatos, velhos amigos, para nos rirmos destes que, talvez para serem dignos herdeiros de papá, são todos da kuribeka. Precisam de muleta. E havíamos de sorrir recordando velhas histórias das moças do colégio de Sá da Bandeira, naquele tempo dirigido pela Madre Paiva Couceiro, filha do inesquecível capitão das guerras de África e das incursões monárquicas. Contavam elas que, quando sabia que alguma loja maçónica estava a ser construída ou instalada, a Madre ia na noite escura mais as moças pôr medalhas bentas na obra.
E diziam, contentes, que aquelas kuribekas davam em nada.
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terça-feira, janeiro 10, 2012
Olhando o caminho, por António Sardinha
…”Tal é a hereditariedade espiritual a que nos acolhemos filialmente, — nós que em 1914 pegámos do arado, lançando na herdade lusitana um sulco tão profundo que já não há vento daninho que o possa apagar. A nossa faina de semeadores não conheceu mais um minuto de descanso ou adormecimento.
Do que tem sido essa batalha, ou defrontando-nos com a anarquia que nos desagrega, ou fazendo face ao peso morto que ameaça sufocar, no seu pretenso conservantismo, o princípio de renovo em que Portugal parece querer florir, - do que tem sido essa batalha não é para aqui o contá-lo e comentá-lo. Basta que assinalemos com a maior humildade de propósitos o trajecto que já se andou, tanto em extensão como em intensidade. Na desordem geral, dos espíritos, sente-se, apalpa-se uma certeza, uma coesão que se desenha e robustece, e aumenta. Frutifica o sincero entusiasmo do reduzido grupo de vontades que em 1914 se meteu à empresa penosa de restaurar a alma da Pátria, voltando à senda esquecida da sua tradição.
E porque se escreve a palavra "tradição", entendemos dever precisar-lhe o sentido. Não se trata de um regresso — duma suspensão. Filosófica e historicamente o nosso conceito de "tradição" equivale a dinamismo e continuidade. Estamos, por isso, bem longe de nos confinarmos numa ideia saudosista da sociedade que foi ou das gerações que passaram. Pelo contrário, abertos às solicitações clamorosas deste instante de febre, olhamos o futuro com um alto desejo de o prepararmos, melhor e mais belo, do que é a actualidade, tão horizontal e espessa em que vivemos.”
…”Reflectindo no seu conflito o conflito da sociedade em geral, a sociedade portuguesa dissolve-se, vai-se, varrida pelo individualismo nas suas últimas e extremadas consequências. Serenos, no raciocínio das nossas convicções que a fé amplia num fundo de claridade invencível, não há desânimo que nos vença, nem tormenta que nos vergue. Salve-se o que subsista ainda de divino e de humano no amontoado de coisas sem nexo em que Portugal se subverte, incaracterizado e difamado. É obedecendo a tão religiosa obrigação para com Deus e para com a Pátria, criada à sua Semelhança e Imagem, que nós não desfalecemos nem um instante sequer na jornada empreendida, já se completaram nove anos, quando a mocidade nos punha nas veias fanfarras de triunfo. Semeou-se? Pois colher-se-á! E para que resulte em outras colheitas, e a seara cresça sempre, viçosa e farta, de novo entregamos à graça das Estações um pequeno punhado de grão, por acaso guardado no nosso pequeno celeiro.”
Elvas, Quinta do Bispo, Janeiro, 1923.
In http://www.angelfire.com/pq/ unica/ il_as_olhando_o_caminho.htm
Do que tem sido essa batalha, ou defrontando-nos com a anarquia que nos desagrega, ou fazendo face ao peso morto que ameaça sufocar, no seu pretenso conservantismo, o princípio de renovo em que Portugal parece querer florir, - do que tem sido essa batalha não é para aqui o contá-lo e comentá-lo. Basta que assinalemos com a maior humildade de propósitos o trajecto que já se andou, tanto em extensão como em intensidade. Na desordem geral, dos espíritos, sente-se, apalpa-se uma certeza, uma coesão que se desenha e robustece, e aumenta. Frutifica o sincero entusiasmo do reduzido grupo de vontades que em 1914 se meteu à empresa penosa de restaurar a alma da Pátria, voltando à senda esquecida da sua tradição.
E porque se escreve a palavra "tradição", entendemos dever precisar-lhe o sentido. Não se trata de um regresso — duma suspensão. Filosófica e historicamente o nosso conceito de "tradição" equivale a dinamismo e continuidade. Estamos, por isso, bem longe de nos confinarmos numa ideia saudosista da sociedade que foi ou das gerações que passaram. Pelo contrário, abertos às solicitações clamorosas deste instante de febre, olhamos o futuro com um alto desejo de o prepararmos, melhor e mais belo, do que é a actualidade, tão horizontal e espessa em que vivemos.”
…”Reflectindo no seu conflito o conflito da sociedade em geral, a sociedade portuguesa dissolve-se, vai-se, varrida pelo individualismo nas suas últimas e extremadas consequências. Serenos, no raciocínio das nossas convicções que a fé amplia num fundo de claridade invencível, não há desânimo que nos vença, nem tormenta que nos vergue. Salve-se o que subsista ainda de divino e de humano no amontoado de coisas sem nexo em que Portugal se subverte, incaracterizado e difamado. É obedecendo a tão religiosa obrigação para com Deus e para com a Pátria, criada à sua Semelhança e Imagem, que nós não desfalecemos nem um instante sequer na jornada empreendida, já se completaram nove anos, quando a mocidade nos punha nas veias fanfarras de triunfo. Semeou-se? Pois colher-se-á! E para que resulte em outras colheitas, e a seara cresça sempre, viçosa e farta, de novo entregamos à graça das Estações um pequeno punhado de grão, por acaso guardado no nosso pequeno celeiro.”
Elvas, Quinta do Bispo, Janeiro, 1923.
In http://www.angelfire.com/pq/
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